O imóvel foi apreendido no âmbito da Operação Caranguejo, que teve como alvo efectivos das FAA destacados na Casa Militar do Presidente da República.
Manuel Rabelais vem “lutando” pela recuperação do imóvel, no valor de 1 milhão, 889 mil e 200 dólares, desde que o mesmo foi apreendido e incluso na lista de bens recuperados pelo Estado, por terem sido adquiridos com fundos desviados da Casa de Segurança do Presidente da República.
Os juízes declararam, no acórdão datado de 16 de Junho, a que OPAÍS teve acesso, que não reconhecem o recurso interposto pelo antigo director do extinto Gabinete de Revitalização da Comunicação Institucional e Marketing da Administração (GRECIMA), terceiros nos autos, por carecer de objecto.
Segundo uma fonte, este modo o Tribunal declarou que não está em condições de analisar se há ou não possibilidade de devolver o referido imóvel a Rabelais por, alegadamente, não estar em posse da Justiça. No entanto, durante as audiências de discussão e produção de provas, no Tribunal Provincial de Luanda, o Ministério Público não só confirmou a apreensão do imóvel como descartou qualquer possibilidade de o antigo governante vir a juntá-lo ao seu leque patrimonial.
Manuel Rabelais reclama pela devolução deste imóvel, na qualidade de um dos herdeiros do malogrado Gamaliel Óscar Pereira da Gama, um dos principais mentores e beneficiários deste esquema ardiloso, de quem o adquiriu e não passou em seu nome. Trata-se do imóvel número 603, da torre Cuanza-Norte, do condomínio Belas Business Park, em Talatona, adquirido pela empresa de Gamaliel, designada G-Genesis, Lda, ao preço de 1 milhão e 889 mil e 200 dólares norte-americanos, no dia 26 de Novembro de 2014.
O Ministério Público (MP) diz, num documento arrolado ao processo, que Gamaliel da Gama adquiriu o imóvel, em primeira instância, à Odebrecht, com fundos desviados da Casa de Segurança. Para sustentar a tese da proveniência do dinheiro, a magistrada do Ministério Público, Helga Cadete, disse, nas alegações finais, que antes de ingressar nas Forças Armadas Angolanas (FAA), Gamaliel da Gama não tinha empresas, nunca recebeu herança, doação ou crédito bancário nem venceu em jogo de sorte ou azar.
E, por outro lado, não dispunha de qualquer outro rendimento que justifica o património que ostentava. A G-Genesis, Lda, gestão imobiliária, foi constituída a menos de dois meses antes de Gamaliel da Gama ter adquirido o referido imóvel, isto é, a 6 de Outubro de 2014.
A gestão desta empresa unifamiliar estava a seu cargo e até à data da sua morte não tinha nenhum sócio. Para Helga Cadete, o ex-ministro da Comunicação Social não aparece no processo como arguido, testemunha ou declarante, mas, sim, como terceiro de má-fé, reclamando na justiça a titularidade de um imóvel que Gamaliel da Gama adquiriu nas circunstâncias acima mencionada. “Manuel Rabelais conhecia com culpa os vícios do negócio. Ao menos podia questionar como um major das FAA tem mais de um milhão de dólares para a aquisição de um imóvel”, frisou.
As provas de Rabelais
Manuel Rabelais tentou fazer prova de que é o legítimo proprietário do imóvel, junto dos órgãos de justiça, apresentando documentos que o Ministério Público classifica de insuficientes para o efeito. Numa exposição feita à Justiça, na fase de instrução processual, intitulou-se como representante legal da G-Genesis, Lda, pelo que, proprietário do referido imóvel. “Não vislumbramos a acta de alteração dos estatutos da G-Genesis, Lda como prova.
Apenas alegações como de costume”, frisou a procuradora, salientando que os referidos documentos foram anexados ao processo como prova. A magistrada Helga Cadete esclareceu que o pedido do ex-governante não tem razão de ser, uma vez que, até à data da apreensão, o imóvel se encontrava na esfera jurídica da G-Genesis, Lda. Por outro lado, de acordo com o MP, para sustentar a sua tese, Manuel Rabelais afirmou também que lhe havia sido passada uma procuração irrevogável pela representante legal da empresa G-Genesis, Lda.
Manuel Rabelais contou, no referido documento, que a aquisição deste bem material teve como base uma permuta de imóveis que fez com Gamaliel da Gama. Isto é, transferiu da sua esfera patrimonial um imóvel que detinha em Lisboa, Portugal, para Gamaliel da Gama e este, em contrapartida, fez o mesmo, passando-lhe o apartamento localizado no condomínio Belas Business Park, um dos mais luxuosos da capital do país.
Um jurista “encurralado” pela justiça
O jornalista e jurista de formação argumentou que não se podia passar para a esfera do Estado o referido bem, tendo em conta que a G-Genesis, Lda não é arguida no referido processo e a responsabilidade criminal de Gamaliel da Gama cessou com a morte deste.
A magistrada disse que o negócio celebrado entre Manuel Rabelais e a empresa G-Genesis, Lda é mais um flagrante de ocultação de património, “uma manobra clara com o único objectivo de branquear capitais”. Quanto à prorrogação irrevogável passada a Manuel Rabelais, o Ministério Público levanta várias suspeições, classificando-a de “muito duvidosa”, alegando que quem a passou não tinha, aparentemente, poder para o efeito, uma vez que o representante legal da empresa era o malogrado Gamaliel da Gama.
Explicou que “ainda que eventualmente a formalidade acima descrita tenha existido, o que temos fortes dúvidas, lembramos que a procuração irrevogável é apenas um documento de representação (…), jamais substitui as formalidades estabelecidas na lei para a passagem de titularidade de um imóvel”.
Helga Cadete enfatizou que mesmo que a transmissão tivesse ocorrido, não existe na lei impedimento de o Estado usar os meios afins para perseguir um bem adquirido por ocasião do crime cometido, onde e com quem ele estiver. “A procuração passada ao reclamante Manuel Rabelais não é uma transmissão efectiva da propriedade para o seu nome.
É mais um flagrante de ocultação de património, porquanto na prática, o imóvel não é da G-Genesis, Lda, porque passou poder de disposição, e nem de Manuel Rabelais, porque não entrou legalmente na sua esfera jurídica”, justificou. Por outro lado, salientou que apesar de os representantes dos herdeiros menores de Gamaliel da Gama terem contestado a acusação, na prática não contrariaram a posição do Ministério Público. Muito pelo contrário, segundo ela, solicitaram em análise que a Justiça tivesse em consideração a situação destes órfãos. OPAIS