Sérgio Raimundo falava à imprensa no final da sessão do julgamento, iniciado em 31 de maio passado, que envolveu Augusto Tomás, ministro dos Transportes entre 2008 e 2017, acusado de ter cometido quatro crimes, o mais grave de peculato, no controlo da gestão do Conselho Nacional de Carregadores (CNC).
"O que nós estamos a assistir é justamente à tentativa de demonstrar à sociedade que as coisas mudaram, porque o que nós ouvimos aqui, a sermos sérios, todos os ministros actuais tinham que estar aqui no banco dos réus", referiu.
Sérgio Raimundo defendeu ainda que, se for para mostrar à sociedade que o país está a mudar, não deve ser usada a Justiça.
"Usem outra coisa, que é governar bem e melhor para o povo", argumentou.
Segundo Sérgio Raimundo, ao longo dos três meses de julgamento, em nenhum momento passou na sala de audiência qualquer testemunha ou declarante a dizer que o seu constituinte "se locupletou deste ou daquele valor".
"Toda a gente disse que Augusto Tomás mandou pagar despesas do Ministério dos Transportes. O Ministério dos Transportes não é uma empresa do Augusto Tomás, é um departamento do executivo", referiu.
"Portanto, eu ainda não entendi como é que se pode dizer que Augusto Tomás se locupletou de ‘x' milhões de dólares, ‘x' milhões de kwanzas e ‘x' milhões de euros, se não há nenhum único facto, nem na narrativa deste acórdão, que indicia ou aponta como é que estes dinheiros foram parar na conta ou na esfera jurídica ou patrimonial de Augusto Tomás", reforçou.
O advogado frisou que o direito penal "não se conforma com presunções", e no acórdão apenas foram ouvidas presunções.
"Augusto Tomás era o ministro dos Transportes deveria saber ou sabia, mas quem é que disse que sabia? Não há nenhum facto que aponta nesse sentido. O único fundamento de uma decisão condenatória é o juízo de certeza e nesta sede não ouvimos certeza nenhuma sobre aquilo de que Augusto Tomás vinha acusado", sublinhou.
A defesa recorreu da sentença, um recurso ordinário para o plenário do Tribunal Supremo, tendo em conta que já atuou como um tribunal de primeira instância, esperando que seja célere a resposta ao recurso.
"Vamos trabalhar e acreditar que ainda assim alguém com responsabilidade neste país possa olhar para este tipo de situações, porque isto é perigoso, é assustador, por isso estou a repensar seriamente se devo continuar a exercer advocacia em Angola. Não há condições para o exercício sério de uma advocacia, porque não há uma verdadeira administração da justiça neste país", considerou.
Por sua vez, Orlando Cumandala, cunhado de Augusto Tomás, o único réu que se encontra em prisão preventiva desde setembro de 2018, mantendo-se a sua situação carcerária após condenação, classificou de "político" este julgamento, porque em termos judiciais não foi vista matéria que de facto pudesse condenar o seu familiar.
"E acompanhei todos os dias aqui o julgamento deste nosso grande ex-ministro, não houve qualquer imputação sobre factos reais que Augusto Tomás tenha cometido, noutro processo talvez pudesse ser condenado, talvez pudesse ser imputada responsabilidade, mas neste processo, de facto, não vimos nada", disse.
Orlando Cumandala admitiu que não se pode apelar inocência para todos os crimes de que vinha acusado Augusto Tomás, reconhecendo que "houve de facto" uma falta de atenção naquilo que foram os actos praticados pelo director do CNC.
Para Orlando Cumandala, a pena de 14 anos "é pesada", sobretudo "para um indivíduo que neste processo quase não tem nada, é inibido de qualquer acusação".
Augusto da Silva Tomás foi condenado pelos crimes de peculato, violação das normas de execução do plano de orçamento sob forma continuada, abuso de poder sob forma continuada e participação económica.
O Tribunal Supremo julgou ainda os réus Isabel Bragança, Manuel Paulo, Rui Moita e Eurico da Silva, todos administradores do CNC, igualmente condenados a penas de 12, 10, 10 e dois anos respectivamente, a última suspensa.