Com processos concluídos, o procurador-geral da República transformou-se em “inimigo” de Eduardo dos Santos
As autoridades atribuem o investimento feito pela filha do antigo Presidente à injeção de capital público, ordenada pelo pai, num veículo fantasma criado na zona franca da Madeira — a Winterfeel — que lhe assegura os interesses na empresa portuguesa.
“Mais uma vez foi o Estado por intermédio da Ende — Empresa Nacional de Distribuição de Eletricidade — quem avançou com o dinheiro para acomodar a filha”, denunciou fonte do Conselho de Ministros do Governo angolano.
Sobre condições a impor a Isabel dos Santos, a Ende, segundo apurou o Expresso, deverá rever os termos desta operação que, a sentir-se lesada nos seus interesses, poderá passar pela recuperação do dinheiro ou pela tomada de uma posição na Efacec ou ainda pela retirada do negócio.
“Se não quiser aceitar as nossas condições, não teremos outra alternativa senão levarmos o caso ao tribunal”, garantiu fonte da Ende.
Inconformado, a um mês de abandonar definitivamente a liderança do MPLA, José Eduardo dos Santos prepara-se para introduzir na agenda política angolana as consequências de medidas que culminaram com a anulação de negócios multimilionários que havia atribuído ao seu clã familiar.
“Engana-se quem julgava que ficaria indiferente à forma como estão a ser postos em causa os interesses dos filhos”, disse ao Expresso um dirigente do MPLA apoiante de Eduardo dos Santos.
Como um leão ferido, depois de se ter sentido “traído” por João Lourenço, o antigo Presidente, segundo fonte dos serviços de inteligência, “acaba de eleger o procurador-geral da República como o seu novo inimigo”.
Com os filhos afastados da Sonangol, do Fundo Soberano e da Canal 2 da Televisão Pública de Angola e mais recentemente de outros negócios, nos últimos tempos avolumou-se, sobre o antigo Presidente, a pressão familiar e de ex-colaboradores.
Os estragos da cruzada de João Lourenço podem, porém, não ficar por aqui e vir a estender-se em breve a outros alvos também em Portugal.
A Sonangol, detentora de 40% da Esperaza Holding, ao assumir agora a liderança daquela empresa, que representa os seus interesses e os de Isabel dos Santos na Galp, acaba de anular a margem de manobra que era detida por esta durante o tempo em que esteve à frente da petrolífera angolana.
A tensão gerada à volta das medidas adotadas por João Lourenço subiu de tom esta semana com a tentativa de desmentido feita por Isabel dos Santos ao recebimento de uma notificação da PGR.
Esta instituição não só veio reafirmar a sua posição como manifestou estranheza por Isabel dos Santos não se ter apresentado para sustentar a queixa-crime por alegada difamação por si apresentada contra o Presidente da Sonangol, Carlos Saturnino.
O líder da petrolífera angolana, ouvido pela PGR, voltou a apresentar provas de graves irregularidades registadas na gestão de Isabel dos Santos no quadro de várias acusações que a empresária terá de responder quando, pela segunda vez, voltar a ser chamada a depor naquela instância.
Na justiça, mas em Londres, está também em jogo o caso do Fundo Soberano depois do Tribunal Supremo da capital britânica ter decidido levantar a ordem de congelamento de 3 mil milhões de dólares que se encontram à guarda de Jean Claude Bastos de Morais, o antigo sócio do filho do ex- Presidente, José Filomeno dos Santos.
Esta decisão pode deixar confortável o empresário suíço, mas a nova administração do Fundo Soberano, liderada por Carlos Alberto Lopes garante que vai prosseguir ações para o controlo do seus ativos.
E uma fonte da PGR adverte que “ se antes já era improvável obter um acordo, agora a situação tornou-se ainda mais difícil perante as condições impostas pela outra parte”.
O final de 2018 ameaça, desta forma, vir a ser nebuloso para a vida política angolana, com a conclusão de inquéritos judiciais que poderão vir a culminar com o envio, em breve, de vários processos para o tribunal.
O envolvimento nalguns desses casos dos filhos e de alguns dos seus antigos colaboradores de confiança está a ‘inquietar’ Eduardo dos Santos.
A descoberta, por outro lado, de graves irregularidades cometidas no tempo em que esteve a frente do governo provincial de Luanda, levaram o general Higino Carneiro a bater a porta do antigo Presidente, no Bairro Miramar, onde reside.
Carneiro, no encontro mantido com José Eduardo, ter-se-á mostrado surpreendido por estar a ser alvo de um inquérito no exercício da função de parlamentar e de membro da direção do MPLA.
“Não está acima da lei e não se deve esquecer que fez pagamentos de empreitadas que nunca saíram do papel...”, lembrou fonte que acompanha o processo. Expresso