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Combate à corrupção: E lá chegou a vez de Higino Carneiro

Post by: 08 February, 2019

Desta vez é a sério! O general e deputado Higino Carneiro foi, oficialmente, notificado para comparecer no DNIAP, pelo que, deverá fazê-lo às 9 horas de terça-feira (12), com o objectivo de prestar declarações, ao abrigo de um processo que decorre seus trâmites na PGR, na sequência da constatação de fortes indícios de prática de crimes de peculato.

Ao tomar contacto com a notificação, de acordo com fonte que lhe é próxima e que prefere o anonimato, Higino Carneiro mostrou-se profundamente agastado, manifestando, de forma exaltada, o seu descontentamento “pela forma como está a ser tratado”.

Higino Carneiro considera-se também, e faz questão de realçar em vários círculos de sua influência, um dos arquitectos da paz, a par do ex-presidente José Eduardo dos Santos, por ter participado nas diferentes etapas cruciais do longo processo negocial, que pôs termo ao conflito armado e acomodou politicamente a UNITA. Por essa razão, entende que merece tratamento diferenciado, de protecção e respeito pelo estatuto conquistado, apesar das evidências muito profundas de que construiu o seu império, dentro e fora do país, com suporte no descaminho de fundos públicos, bem como, de chorudas comissões financeiras subtraídas de orçamentos de obras públicas que, em consequência, influenciaram a sua qualidade e tempo de vida útil.

Estradas nacionais, os estádios do CAN-2010, a construção de unidades hoteleiras e a venda de terrenos em áreas nobres, são alguns dos casos mais visíveis, quer em Luanda, no Cuanza Sul ou no Cuando Cubango, províncias onde exerceu as funções de governador.

Inicialmente, a audição de Higino Carneiro estava marcada apenas para o dia 20 de Fevereiro. Embora a nossa fonte não tenha confirmado, a antecipação da convocação de Higino Carneiro para o dia 12 (e até estava para ser hoje, sexta-feira) apesar de ter relação directa com o envolvimento do ex-director do INEA, Joaquim Sebastião, bem como de mais seis seus colaboradores, entretanto já detidos, não resulta das inúmeras provas documentais encontradas em 53 malas, num apartamento, situado no bairro do Alvalade, cuja análise prossegue. Tem sido um processo longo, reconhece a nossa fonte, porque a PGR não dispõe de quadros suficientes para a realização célere desse trabalho, que exige atenção particular.

Para a fonte que temos referido, é prematuro avançar já com qualquer prognóstico sobre decisões que o DNIAP tomará, após o ‘aperto’ a Higino Carneiro programado para terça-feira. Mas, a nossa fonte acredita que, tal como aconteceu no dia 5 com o também deputado Manuel Rebelais, por respeito a imunidades consagradas pelo artigo 150 da Constituição da Republica de Angola (CRA), não escapará à aplicação da medida preventiva de identidade de residência (uma variante da prisão domiciliar), ficando obrigado a apresentar-se todas as semanas às autoridades.

Para o seu caso, também não se colocará de parte a hipótese de tentativa de fuga, porque Higino Carneiro até é proprietário de meios aéreos de transporte. Por essa razão, tal como ocorreu com o ex-director do GRECIMA, o DNIAP deverá pedir que Higino Carneiro proceda a entrega dos seus passaportes, decretando, concomitantemente, a proibição de se deslocar para além da Barra do Cuanza ou de Catete. Ou seja: não poderá sequer, deslocar-se às suas fazendas, no Cuanza Sul ou no Cuando Cubango, onde dispõe de uma unidade hoteleira de referência.

De acordo com a nossa fonte, os próximos servidores públicos suspeitos de prática de crimes de peculato que serão convocados pelo DNIAP, são os ex-governadores da Huíla e do Zaire, João Marcelino Tyipingue e José Joanes André, respectivamente.

Joanes André, é um engenheiro de Construção Civil e Industrial, que exerceu funções de chefe de Sabotagem Económica do Departamento de Operações do então Ministério da Segurança, tendo ascendido para cargos como de secretário de Estado da Construção e de vice-ministro das Obras Públicas, entre 2008-2010, no tempo de gestão de Higino Carneiro. Foi também coordenador da Comissão Técnica Executiva de Coordenação de Projectos de Luanda.

Quer Tyipingue, quer Joanes André são acusados, igualmente, de crimes de peculato.

A nossa fonte deu-nos conta ainda que, o próximo passo, diante de tantas evidências de cometimento de crimes já reunidas, será a PGR oficializar, junto do presidente da Assembleia Nacional, o pedido para retirada das imunidades deste primeiro grupo de parlamentares. Mas, é um processo que já se antevê como de difícil gestão, tendo em conta que, esse órgão de soberania foi transformado, ao abrigo de estratégia de protecção definida pela anterior direcção do MPLA, no principal refúgio de boa parte dos seus dirigentes e de gestores públicos suspeitos de má gestão de fundos públicos. E na lista de suspeitos, com fortes evidências de culpabilidade, de acordo com a nossa fonte, também constam os nomes de Fernando da Piedade Dias do Santos e de Pedro Agostinho de Neri, deputado que exerce as funções de secretário-geral da AN, tido como cúmplice nos actos praticados pelo presidente da AN.

Entretanto, uma questão que tem dividido juristas e deputados, é o caso daqueles que, nomeados para o exercício de cargos públicos, depois de terem tomado posse na Assembleia Nacional foram obrigados, por força de lei que impede o duplo vínculo laboral nos órgãos do Estado, a suspender o seu mandato. O caso de maior visibilidade é o de Augusto da Silva Tomás, que interrompeu o seu mandato para exercer o cargo de ministro dos Transportes, mas foi detido logo após a sua exoneração. Aventa-se mesmo a hipótese de que, tenha sido a gravidade do desfalque no Conselho Nacional de Carregadores e de vários outros de que é acusado, que ‘forçou’ o Chefe do Executivo a proceder à sua exoneração, deixando-o, em consequência, apto para que a Justiça, sem amarras políticas, desse continuidade ao seu trabalho de investigação. A questão que se põe é se, nesses casos, se deve ou não respeitar imunidades, tendo em conta o facto de que, a interrupção pode, ou não, anular o acto inicial de posse.

Contudo, citando ainda a nossa fonte, foi para “fugir dessa abertura que permitiu caçar e encarcerar o marimbondo Augusto Tomás, que Marcelino Tyipingue, após a sua exoneração do cargo de governador da Huíla, correu para Luanda e montou acampamento na Assembleia Nacional, exercendo pressão a todo terreno junto da direcção da sua bancada parlamentar e de Fernando da Piedade Nandó, para acelerarem o levantamento da suspensão do seu mandato, para tomar o assento a que tem direito, como cabeça de lista do círculo provincial da Huíla, onde o MPLA elegeu cinco deputados”. No entanto, como foi clarificado no caso do deputado Manuel Rebelais, as imunidades não retiram a obrigatoriedade de serem ouvidos ou prestarem esclarecimentos sobre eventuais crimes que tenham praticado fora do exercício da deputação.

Contudo, esse braço de ferro que se avizinha parece não preocupar a PGR e para a nossa fonte, até será interessante para se saber quem é quem afinal na bancada do próprio maioritário, a parte mais visível e implicada em casos de peculato e de corrupção activa.

A cruzada contra a corrupção é encabeçada pelo Titular do Poder Executivo, que é também o presidente do MPLA. A ele competirá orientar o grupo parlamentar do seu próprio partido, para não obstaculizar o exercício da Justiça, sob pena dele próprio ficar desacreditado, embora em inúmeros círculos se condene a forma como dirige essa cruzada. Pelo menos agora, parece que se abrirão as portas para assistirmos a segunda parte do filme, que começou com a detenção de Augusto Tomás, caso até então inédito entre nós.

Por Ramiro Aleixo

Last modified on Friday, 08 February 2019 13:52
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