A economista angolana Fátima Roque identifica a ascensão dos movimentos ‘jihadistas’ como a nova ameaça para África, nesta década, no seu mais recente livro, que lança esta quinta-feira, em Lisboa.
“Estudei toda aquela vasta região, que vai desde o Mali até ao corno de África, precisamente pela forma como os ‘jihadistas’ operam”, apontou, em entrevista à Lusa, a propósito do livro “Uma década de África”.
Fátima Roque, ex-quadro da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), rejeitou que se trate de um livro apenas sobre economia africana, até por abordar, igualmente, a forma como os movimentos ‘jihadistas’ têm evoluído no continente africano, o que considera ser a nova ameaça para África, nesta década.
A propósito dos movimentos religiosos, Fátima Roque sublinha que também destacou no seu livro “o papel das mulheres” em África.
“A mulher foi guerrilheira, transportadora de armas e munições de uns sítios para os outros, a mulher é raptada e violada pelos seus raptores. Depois, quando consegue fugir, vai para os campos de refugiados e é violada (…) Dos campos de refugiados, volta para as suas regiões de origem e ninguém a recebe”, explicou, na entrevista à Lusa.
Nesse sentido, a autora defende que “alguma coisa tem de ser feita para integrar estas mulheres”, até porque “podem ser muito úteis para que haja paz” e “reconciliação”, tendo em conta que “conheceram os dois lados da guerra”.
“Conheceram os movimentos ‘jihadistas’, conheceram os outros. Portanto podem contribuir e ajudar a distribuir a ajuda humanitária e isso é muito importante”, afirmou Fátima Roque.
O livro, lê-se, termina “com uma sombra pessimista nos olhos, em relação ao progresso de curto e médio prazo para África”, com Fátima Roque a criticar também a administração de Donald Trump.
“Não tem, praticamente, política africana”, defende Fátima Roque, acrescentando que as taxas que o Presidente norte-americano pretende aplicar à importação de produtos terá consequências elevadas para a economia africana.
Pelo contrário, explica que “a China e a Rússia até agora tiveram um papel positivo e têm investido muito em África”.
Sobre as lideranças em África, a quem não poupa críticas ao longo de todo o livro, esclarece, na entrevista à Lusa, que é necessário uma “mudança de mentalidades”.
“Essas mentalidades incorporam tanto as lideranças que estão no poder atualmente, como também as lideranças dos partidos da oposição. E não são só as lideranças políticas, mas também as lideranças económicas”.
Para Fátima Roque, é preciso que surja, com urgência, uma classe média em África, para fiscalizar a democracia. “A sociedade civil também pode ter um papel importante em África. Nós precisamos de uma classe média grande e temos uma classe média diminuta, que não chega a 5%, na maior parte dos países de África”.
“Não há dúvida de que África precisa de mudar. Essa mudança já está a ser feita em alguns países, mas em poucos ainda, em muito poucos”, defende.
O livro “Uma década de África”, apresentado hoje em Lisboa, tem prefácio de Adriano Moreira e aborda igualmente as cada vez mais importantes reservas de petróleo e gás em África, e desde logo em Angola, de onde é natural.
“Já não sei se isso é a nossa riqueza, o nosso destino ou o nosso infortúnio. A única coisa que sei é que temos muito rapidamente de diversificar, deixar de ter a economia baseada só na exportação de um produto e investir em infraestruturas”.
A autora dedica a obra “aos povos de África” e à sua luta “para livrarem os seus países dos líderes ditadores e corruptos” e “mudarem o destino” do continente.