Advogados angolanos queixam-se de “desconsiderações” nos processos de corrupção

Post by: 30 March, 2021

O bastonário da Ordem dos Advogados de Angola lembrou hoje que o direito à defesa está consagrado na Constituição e lamentou as “desconsiderações” contra os defensores de cidadãos implicados em processos de corrupção, sobretudo os mais mediáticos.

Luís Paulo Monteiro, que discursava na abertura do ano judicial, em Luanda, não poupou críticas aos órgãos judiciais e deixou várias sugestões para melhorias na justiça, apelando a que não haja “hesitação” em 2021.

O responsável da Ordem dos Advogados de Angola (OAA) sublinhou que o direito de defesa é consagrado na lei para todos os cidadãos.

“Mas temos vindo a assistir a sucessivas desconsiderações verbais e escritas contra o bom nome de advogados que aceitam exercitar este direito a favor de cidadãos implicados nos mediáticos processos de corrupção”, apontou Monteiro, indicando que têm ocorrido “vários exemplos” de uma “situação extremamente grave, em particular contra advogados criminalistas, que é urgente reverter”.

O bastonário da OAA afirmou que estão em causa conquistas anteriores dos advogados ao nível do atendimento dos seus constituintes que se encontram presos, já que, atualmente, das 42 prisões só três mantêm disponíveis salas de advogados, situação que viola a Constituição e que muitos consideram “uma nítida hostilidade contra o direito da defesa”.

“Estas práticas representam uma profunda desconsideração contra os direitos constitucionais dos advogados e não tem qualquer justificação de ser. Apelamos, por isso, ao respeito pela dignidade e prerrogativas dos advogados angolanos, criando-se salas de advogados nos estabelecimentos prisionais”, reforçou.

Luís Paulo Monteiro disse que a eficiência e eficácia do sistema judicial estão “ofuscadas” e sugeriu várias medidas para a credibilização da justiça, entre as quais convocação e realização de reuniões de concertação entre os titulares de órgãos que fazem parte da comissão nacional de coordenação judicial, fórum privilegiado para o diálogo entre as profissões judiciárias, mas que não está a funcionar.

Salientou ainda que existe um grande défice de execução das leis, do topo à base da administração da justiça.

Por outro lado, apelou ao fim das “situações de tensão e crispação entre dois tribunais superiores de recurso sobre quem deve assinar o mandado de soltura de um cidadão” e abordou também a desigualdade de remuneração entre os juízes dos quatro tribunais superiores, bem como os seus assessores, pedindo igualmente que se evitem reclamações de falta de seriedade e transparência dos seus concursos públicos.

“Há que prevenir os tristemente célebres processos judiciais de magistrados contra magistrados”, sublinhou o bastonário, apelando a uma cultura de cumprimento restritivo da lei para que a justiça seja credível.

Mostrou-se também favorável ao reforço das competências do Conselho Superior da Magistratura Judicial (CSMJ) e da alteração do modelo das precedências dos tribunais superiores.

“Somos a favor que o CSMJ faça as pazes com a Constituição da República e deixe de protelar a institucionalização dos juízos de garantia”, acrescentou.

O bastonário da OAA destacou que a morosidade dos processos em tribunal é a principal causa da desconfiança dos cidadãos na justiça e defendeu a inspeção judiciária em todos os tribunais de comarca e nas câmaras do Tribunal Supremo, a publicação da produtividade dos tribunais na abertura dos anos judicias e alteração das férias judiciais.

Para Monteiro, “73 dias é muito tempo e essa paralisação prejudica o movimento processual”.

O dirigente da OAA considerou igualmente que a maioria dos magistrados exerce as suas funções com dignidade e zelo, mas face à existência de “várias denúncias e acusações públicas contra operadores de justiça”, a justiça deve atuar para apurar se tem fundamento ou são meras calúnias.

Luís Paulo Monteiro enalteceu a revisão do Código Penal, mas disse que subsistem problemas que permitem ao Ministério Público ter poderes para limitar direitos fundamentais dos cidadãos e considerou que as ausências dos juízos de garantia contribuem para o facto de haver “mais de 600 processos em instrução condenatória contra meia dúzia de condenações, muito por causa da recolha de provas”.

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