O pedido acontece dois dias antes da cerimónia da abertura do ano judicial, que devia acontecer amanhã, 1, e que foi adiada para uma data não precisada, como confirmou à VOA uma fonte do Sindicato dos Técnicos de Justiça e Funcionários Administrativos do Procuradoria-Geral da República, que, entretanto, se escusou a revelar os motivos.
O jurista Albano Pedro diz que a atitude do Presidente João Lourenço “sinaliza uma “interferência nos poderes do judiciário” e sustenta que a figura visada não está, por lei, obrigada a aceitar o convite.
Pedro evoca a independência dos juízes e desafia o Conselho Superior da Magistratura Judicial a averiguar as denúncias alegadas “por ser o órgão com competência para disciplinar os juízes e até fazer cessar as funções”.
Aquele jurista também defende que a Associação dos Juristas Angolanos deve igualmente se pronunciar “para demonstrar imparcialidade e equidistância nas suas análises”.
“Porque se não o fizer vai demonstrar a tal guerra de cartéis entre o Poder Executivo e o Poder Judiciário”, conclui Albano Pedro.
O advogado Vicente Pongolola considera, por sua vez , que o Presidente da República deve proceder da mesma forma em relação ao presidente do Tribunal Supremo, Joel Leonardo , a quem são imputados vários casos de corrupção e de peculato.
“O caminho não pode ser outro, tem de ser o mesmo”, defende aquele jurista para quem a juíza Exalgina Gamboa não devia esperar pelo convite para renunciar ao cargo, a julgar pelas denúncias que pendem sobre ela, enquanto responsável máxima do TC.
“A impressão de veicula de cá para fora é de que nós não somos sérios”, sustenta Pongolola, advertindo para a eventualidade de casos do género desencorajarem o investimento estrangeiro.
Adiamento da cerimónia da abertura do ano judicial
Entretanto, a cerimónia da abertura do ano judicial, que devia acontecer na quarta-feira, 1, foi adiada para uma data não precisada, confirmou à VOA uma fonte do Sindicato dos Técnicos de Justiça e Funcionários Administrativos do Procuradoria-Geral da República, que se escusou a revelar os motivos.
O acto, que devia ocorrer sob o lema “Pela efectivação da autonomia administrativa e financeira, para fortalecer e eficiência e a eficácia dos tribunais”, devia ser presidido pelo Presidente da República.
Ontem, no post insólito publicado na sua página no Facebook em que a Presidência da República informou que João Lourenço convidou a presidente do TC a apresentar o seu pedido de demissão, aquele órgão destacou que o Chefe de Estado, "tem vindo a acompanhar com alta preocupação as referidas ocorrências e torna público que, na defesa dos mais altos interesses do Estado, após rigorosa ponderação, considerou que a veneranda juíza conselheira presidente do Tribunal de Contas deixou de ter condições para o exercício das suas funções e convidou-a no passado dia 21 de Fevereiro a renunciar ao seu mandato, o que não aconteceu até à presente data".
A Presidência justificou a decisão com "as relevantes ocorrências respeitantes ao funcionamento do Tribunal de Contas, órgão supremo de fiscalização da legalidade das finanças públicas, as quais são susceptíveis de comprometer o normal funcionamento deste importante órgão do poder judicial e manchar o bom nome da justiça angolana".
Mais tarde, o Jornal de Angola, citando a agência Lusa, revelou que Exalgina Gamboa pediu "jubilação antecipada" por "razões de saúde".
O pedido, no entanto, segundo a mesma fonte, foi enviado depois da publicação do post da Presidência hoje.
Refira-se que, nos últimos meses, a presidente do TC tem sido alvo de várias denúncias sobre a forma para tem gasto o dinheiro do tribunal, inclusive através do próprio filho.
O investigador Rafael Marques, no seu blog Makaangola.com, tem feito fortes denúncias e enviado cartas à Procuradoria Geral da República e à Assembleia Nacional para investigação.
Numa das suas primeiras reportagens, o blog mostrou como Gamboa gastou cerca de quatro milhões de dólares do tribunal para comprar mobílias de luxo que colocou na sua casa no Condomínio Malunga, no Talatona, Luanda.
O Maka Angola "endereçou, a 14 de Outubro de 2022, a denúncia ao procurador-geral da República, o ora demissionário general Hélder Pitta Groz, para se procedesse à fiscalização e responsabilização dos actos da presidente do Tribunal de Contas", mas diz que "até à data, não obteve resposta".
Por seu lado, a 7 de Novembro, a presidente da Assembleia Nacional, Carolina Cerqueira, comunicou àquele blog que “tomou boa nota sobre o teor” da denúncia e desencadeou os procedimentos legais para investigar o caso. VOA