Sério Raimundo comentou, em declarações à agência Lusa, a crise que se assiste, nos últimos meses, na justiça angolana, envolvendo figuras máximas de tribunais superiores de Angola, mais concretamente o presidente do Tribunal Supremo, Joel Leonardo, e a ex-presidente do Tribunal de Contas, Exalgina Gamboa, ambos acusados de vários crimes, como peculato, tráfico de influência, nepotismo, extorsão e corrupção.
O jurista considerou que para os dois casos, o Presidente angolano, João Lourenço, está a usar “dois pesos e duas medidas”, agindo de forma diferente “para situações iguais”.
“Infelizmente, eu acho que o Presidente está a usar dois pesos e duas medidas para situações iguais”, referiu.
Segundo Sérgio Raimundo, em relação ao caso da ex-presidente do Tribunal de Contas, o chefe de Estado angolano veio “quase dizer já publicamente que havia provas que ela praticou aqueles atos ilícitos”, enquanto na situação do Tribunal Supremo “praticamente veio fazer a sua defesa, dizendo que (…) não havia provas e que não poderiam agir na base de informações veiculadas nas redes sociais”.
“Mas quer um caso quer o outro começaram nas redes sociais. Nós todos começamos a ouvir os problemas do Tribunal de Contas nas redes sociais, através do Maka Angola, e outras redes sociais (…), em relação ao presidente do Tribunal Supremo, a principal fonte foi o Club K, portanto, não vejo qual é a diferença”, sublinhou.
“E, penso eu, que no âmbito do preceito constitucional, que o Presidente da República diz ter lançado mão para garantir o normal funcionamento das instituições do Estado, também deveria agir assim em relação ao Tribunal Supremo, para garantir a normalidade funcional deste órgão de soberania de grande peso no âmbito da justiça comum, que pode descredibilizar todo o sistema de justiça angolano e deitar por terra todo esforço que o próprio Presidente da República, enquanto titular do poder Executivo, tem levado a cabo para atrair investimentos para a nossa economia”, frisou.
“Porque ninguém vai querer investir num país onde o tribunal superior, a figura principal do tribunal superior, é colocada na lama, da forma como estamos a assistir”, acrescentou.
Sérgio Raimundo considerou que “o caminho mais sério e mais rápido era justamente o Presidente da República convidar o presidente do supremo a afastar-se temporariamente como fez com a presidente do Tribunal de Contas”.
“Ali foi definitivo, mas aqui pelo menos poderia afastar-se temporariamente para que, segundo o critério legal, o presidente mais antigo de uma das câmaras fosse substituí-lo na presidência do plenário na realização das várias sessões, até se esclarecer a situação do atual presidente”, disse o jurista, reiterando que “isto é o mais exigente, é o que o mínimo ético exige”, se de facto se pretende “moralizar as instituições e a sociedade”.
Para o advogado, o que se vem assistindo na justiça “é muito grave, preocupante e desestabilizador para o funcionamento das instituições do país”.
Sobre a última deliberação do plenário de juízes do Tribunal Supremo, que decidiu afastar da liderança das sessões, o juiz presidente daquele tribunal, Sérgio Raimundo aplaudiu a decisão, “para não contaminar a credibilidade das decisões que aí fossem proferidas”.
De acordo com o advogado, o Conselho Superior da Magistratura Judicial (CSMJ) não tem competência, citando o artigo 184 da Constituição da República e o número 26 da Lei 14/11, para apreciar ou anular uma deliberação do plenário, por ser um órgão soberano, sendo o conselho um órgão meramente administrativo e tendo apenas como alternativa, por vias legais e judiciais, impugnar ou arguir a nulidade desta deliberação.