A informação foi transmitida por João Maria de Sousa, em Luanda, referindo-se aos contactos daquela Procuradoria com as autoridades portuguesas, sobre o processo ao agora ex-vice-Presidente de Angola, Manuel Vicente, acusado na Operação Fizz, em Portugal, de corrupção ativa mas que alega que não foi notificado e que continua a gozar de imunidade.
"Já tivemos várias abordagens. Numa primeira fase, o processo esteve quase a ser transmitido para as autoridades angolanas, as autoridades portuguesas depois fizeram um recuo, quando souberam que tinha sido publicada uma Lei da Amnistia em Angola. Daí para cá tem havido contactos, não só ao nível do Ministério Público, mas também ao nível do Estado, através do ministro da Justiça e dos Direitos Humanos", explicou o procurador, questionado pela Lusa à margem de um evento oficial em Luanda.
Sob proposta do então chefe de Estado, José Eduardo dos Santos, o parlamento angolano aprovou em 2016 uma Lei da Amnistia, que entrou em vigor a 12 de agosto do mesmo ano, abrangendo todos os crimes comuns puníveis com pena de prisão até 12 anos cometidos por cidadãos nacionais ou estrangeiros até 11 de novembro de 2015, excetuando os de sangue.
Entretanto, José Eduardo dos Santos e Manuel Vicente cessaram funções a 26 de setembro, com a posse de João Lourenço e Bornito de Sousa, respetivamente como Presidente e vice-Presidente da República.
Contudo, o novo estatuto dos antigos Presidentes da República, que se aplica igualmente aos vice-presidentes, mantém a imunidade, sendo que no caso de Manuel Vicente, após cessar funções assumiu, a 28 de setembro, o cargo de deputado à Assembleia Nacional.
As autoridades angolanas chegaram a pedir um parecer ao Tribunal Constitucional, sobre o levantamento da imunidade a Manuel Vicente, mas, perante a indignação do Governo angolano, a justiça portuguesa avançou com o processo para julgamento.
Este processo tem motivado um agravamento da tensão nas relações entre os dois países, com críticas por parte das autoridades angolanas.
"Não pode deixar de ser sensível. Estamos perante um vice-Presidente da República que, na altura, podia até substituir o Presidente da República, não só nas situações de ausência ou de impedimento, mas até em situação de vacatura tem competência para levar o mandato de Presidente da República até ao final", explicou o procurador-geral angolano.
A procuradora-geral da República de Portugal disse no final de setembro que o Ministério Público (MP) daria resposta a todas as questões técnico-jurídicas processuais que sejam levantadas naquele processo.
Joana Marques Vidal confirmou que deu entrada na Procuradoria um pedido de parecer do primeiro-ministro, António Costa, sobre a situação processual de Manuel Vicente e que o mesmo foi distribuído e será "objeto de avaliação".
Quanto à possibilidade do futuro parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República (PGR) se tornar, ou não, vinculativo para o procurador titular da Operação Fizz, a Joana Marques Vidal explicou que isso depende de decisões que vierem a ser tomadas, incluindo por si, pelo que "está tudo em aberto".
A defesa de Manuel Vicente não se conforma com a acusação e pronúncia do antigo presidente da petrolífera Sonangol no caso que envolve a alegada corrupção do procurador do DCIAP Orlando Figueira, invocando nulidades do processo e o facto de o dirigente angolano não ter sido notificado das graves imputações que lhe são feitas pelo MP português.