«Estamos a assistir ao afastamento de José Eduardo dos Santos», afirma José Eduardo Agualusa, para quem interessa agora saber «se João Lourenço será alguém para ficar ou para conseguir uma transição para uma democracia efetiva».
Candidato presidencial por um partido que só teve dois líderes ao longo da sua existência, tendo de fazer uma campanha eleitoral em situação difícil, no meio da crise económica, João Lourenço continua a ter um espaço de manobra limitado pelo facto de José Eduardo dos Santos (JES) ainda ser líder do MPLA até 2018.
«Ele está apertado entre a necessidade de criar o seu espaço e o seu caminho (sob pena de ser apeado em três tempos) e a necessidade de lidar com com o legado de JES», afirma Miguel Gomes, assessor de comunicação da organização não governamental ADRA. «A Constituição em vigor não lhe facilita as coisas», acrescenta.
Que «haverá uma transição de poder», Agualusa não duvida, até porque JES «está fragilizado fisicamente e está a sair». O que interessa agora, para o escritor, é «saber se nada muda».
«José Eduardo dos Santos só não intervém porque está doente, porque ele vai continuar presidente do MPLA. O que determina não é a vontade dele agora, mas o estado de saúde», afirma, por seu lado, o investigador da Universidade Católica de Angola Nelson Pestana.
«Parece que não tem condições físicas para grandes veleidades», confirma Miguel Gomes. Porém, com esta Constituição, tal como está, JES «manterá o controlo remoto», acrescenta.
«Será uma pequena sombra até o João Lourenço ter o poder para mudar a correlação de forças. Uma coisa é ser presidente do MPLA com João Lourenço candidato e ele ainda Presidente, outra coisa é ser presidente do MPLA com João Lourenço como Presidente da República», explica Pestana.
Para o deputado do MPLA Manuel Fragata de Morais, até 2018 JES continuará a ser líder do partido, depois irá «cuidar mais da Fundação José Eduardo dos Santos e ter projeção a outros níveis que, quiçá, o tempo como Presidente não lhe permitiu até agora. Mas não acho que haverá qualquer papel de maior relevância».
Admitindo que o Presidente possa continuar a ter influência, Fragata de Morais refere que «se for um poder na sombra, será um poder na sombra de futuro muito curto», até «porque todos nós sabemos que ele agora quer cuidar da saúde, dedicar-se à família. Ele é um ano mais novo do que eu e nós agora já não temos mais ambições, a gente agora quer é paz e tranquilidade».
Mais do que a vontade de JES, será a vontade e a capacidade de João Lourenço para definir a transição.
Nelson Pestana acha que «João Lourenço vai tratar o JES como até aqui o JES tratou Isaías Samakuva. E e se ele começar a interferir muito, muda o presidente do MPLA de um dia para o outro». O investigador da Universidade Católica está convencido de que «os bajuladores todos do JES, no dia seguinte à eleição passam-se para o João Lourenço» e o poder de influência do ainda Presidente diminuirá.
«Eu acho que a família de JES vai perder o poder. Acho que talvez não se tenha conformado com isso», sublinha Agualusa. «Evidentemente está a acontecer uma transição de poder de uma pessoa para outra. Não é de regime. De uma corrente para outra. E isso está a gerar inquietação».
SOL