Com a expulsão de Angola, terça-feira, do terceiro contingente de missionários da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), esta decidiu pressionar Jair Bolsonaro a responder na mesma moeda. Luanda tem-se mostrado inflexível, mesmo depois de o Presidente brasileiro ter endereçado uma carta ao seu homólogo, João Lourenço, em abril. Nela, pede que “sem prejuízo dos trâmites judiciais, aumente a proteção dos membros da IURD a fim de garantir a sua integridade física e material e a restituição de propriedades e moradias, enquanto prosseguem as deliberações nas instâncias pertinentes”.
O embaixador do Brasil em Luanda, Rafael Vidal, esteve pela primeira vez, segunda-feira, com o procurador da República junto dos Serviços de Emigração e Estrangeiros (SME) para tentar persuadir as autoridades angolanas a suspenderem a deportação em curso. Em Brasília o embaixador de Angola, Florêncio de Almeida, convocado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, recebeu garantias de que o Governo brasileiro pretende uma “solução pacífica” para o conflito interno na IURD.
“Ainda que existam crimes, caberá aos tribunais, e não ao Governo de um Estado laico, decidir sobre os destinos da igreja”, afirmou ao Expresso fonte do escritório de advogados Amaral Gourgel. Os missionários brasileiros são acusados de branqueamento de capitais e associação criminosa e de terem “obrigado”, ao longo de anos, centenas de angolanos pertencentes à IURD, a submeterem-se na África do Sul a prática de vasectomia, enquanto as mulheres eram intimadas a extrair o útero.
“Há ainda a questão das doações em bens imóveis que eram feitas à igreja e que os brasileiros pura e simplesmente vendiam a seu bel-prazer”, denunciou na terça-feira, em entrevista à televisão angolana, Luís Bezerra, novo líder local da IURD, que nega todas as acusações e garante ter do seu lado a larga maioria dos fiéis, mas teme pelo destino dos recursos financeiros e vasto património imobiliário que a igreja detém em Angola, avaliado em perto de €300 milhões.
“Os nossos fiéis foram alvo da perseguição dos dissidentes angolanos e de brutalidades policiais”, assegura ao Expresso, sob anonimato, um missionário brasileiro. A mão pesada das autoridades atingiu a TVRecord, adstrita à IURD, cuja atividade em Angola foi suspensa há três semanas por alegadas irregularidades e acusada de denegrir figuras do regime de Luanda. Se o diretor da estação, Fernando Teixeira, garante ao Expresso que esta pratica “jornalismo questionador” e não “militância política”, Luanda afirma que alguns dos seus funcionários entraram no país como missionários para “passarem a jornalistas sem o respetivo visto de trabalho”.