Num documento a que a Lusa teve acesso, a PGR revelou que Exalgina Gambôa já foi notificada, enquanto Hailé Vicente da Cruz, que esteve na administração do banco Yetu, se encontra atualmente no exterior do país, não tendo sido ainda notificado.
O processo de inquérito foi aberto "em reação a informações e denúncias públicas" de que teve conhecimento.
Face aos factos apurados “foi aberto um processo-crime, por crimes de peculato, extorsão e corrupção” em que Exalgina Gambôa foi constituída arguida, sendo igualmente arguido no mesmo processo, pelos crimes de extorsão e corrupção, Hailé Musapé Vicente da Cruz.
No comunicado, a PGR “reitera o seu inabalável compromisso com a legalidade” e apelou ao respeito “a todos os atores sociais” pela presunção de inocência.
O nome de Exalgina Gambôa está envolvido em suspeitas desde o ano passado quando o ativista e jornalista Rafael Marques de Morais, que dirige o ‘site’ Maka Angola pediu uma investigação aos gastos exorbitantes da presidente do Tribunal de Contas (TdC).
Na altura, Rafael Marques de Morais revelou que as despesas da juíza, suportadas pelo erário público através do Cofre Privativo do Tribunal de Contas ascenderiam a cerca de 4 milhões de dólares (3,7 milhões de euros) e visavam o apetrechamento da residência, com mobílias adquiridas em duas empresas.
Exalgina Gambôa foi também alvo de notícias, veiculadas inicialmente pelo Africa Monitor e mais tarde pelo Correio Angolense, que envolviam o congelamento de contas de um filho seu (Hailé da Cruz), em Portugal, supostamente constituídas com valores provenientes da conta do TdC domiciliada no banco Yetu.
Segundo Rafael Marques de Morais, documentos provam que a juíza, além dos gastos em mobília e reabilitação de uma casa num “luxuoso” condomínio que lhe foi entregue a estrear e que foram superiores ao valor do imóvel (3,5 milhões de dólares) adquiriu também uma residência para a sua adjunta, no valor de 437 mil dólares.
Aponta ainda um “mistério”, aludindo ao pagamento de 526 milhões de kwanzas (1,1 milhões de euros ao câmbio atual) para a “aparente aquisição de nada”, verba que saiu do Cofre Privativo para a Urbanização Nova Vida.
Este projeto pertence á empresa Imogestin, responsável pela comercialização de imóveis públicos, cujo presidente é o ex-marido de Exalgina Gambôa, Rui Cruz (pai de Hailé da Cruz).
“Trata-se de uma situação inaceitável, absolutamente imoral”, reforçou Rafael Marques de Morais, numa carta dirigida à PGR, apelando a que se atue “imediatamente para acabar com todas as utilizações indevidas de fundos públicos” e que se instaure “o devido processo legal com vista à averiguação dos factos que parecem suspeitos”.
Numa outra carta, dirigida à presidente da Assembleia Nacional, o jornalista chama também a atenção de Carolina Cerqueira e dos deputados para a situação, no sentido de o parlamento exercer o seu papel de fiscalizador da atividade do Tribunal de Contas, “a fim da sua urgente resolução e responsabilização administrativa, política e criminal”.
Informações veiculadas no ano passado davam conta de que as autoridades portuguesas teriam congelado as contas de Hailé da Cruz, tendo este alegado que os fundos pertenciam à sua mãe, Exalgina Renée Vicente Olavo Gambôa.
O Africa Monitor avançava que pouco depois de assumir as funções de presidente do TdC, em 2018, Exalgina Gambôa ordenou a abertura de uma conta bancária no Banco Yetu, ao qual se juntou o seu filho, em setembro desse ano.
Em maio de 2021, Hailé Cruz ter-se-á incompatibilizado com Mário Gavião, presidente da comissão executiva do Banco Yetu, e saiu, tendo os fundos do TdC aí domiciliados sido transferidos para uma conta privada.
Exalgina Gambôa ter-se-á então deslocado a Portugal para tentar desbloquear o dinheiro e terá procurado o apoio do Presidente, João Lourenço, sem sucesso.