Concentrados em frente do Tribunal Provincial de Luanda Dona Ana Joaquina, com dísticos em punho, que diziam: “Magistratura Independente, Instituições Fortes” e “Justiça é Ação, e Não Discursos”, juízes e procuradores permaneceram naquele local em silêncio por meia hora.
Em declarações à imprensa, o presidente da Associação dos Juízes de Angola (AJA), Esmael da Silva, disse que o protesto visou chamar a atenção das instituições sobre a necessidade de uma reflexão do estado atual da justiça.
“Isso passa por abordar a questão da estrutura física dos tribunais, passa por avaliar a quantidade de funcionários que laboram para executar as decisões, para notificar as partes, ou seja, para fazer o tribunal acontecer”, referiu.
Esmael da Silva sublinhou ainda que os atores da justiça angolana pretenderam igualmente chamar a atenção para os investimentos que têm sido feitos na área da justiça e que é igualmente necessário imprimir celeridade processual.
“A verdade é que, do que se aprecia a olho nu, nós estamos dentro dos processos, estamos dentro dos tribunais e podemos falar de dentro para fora, mas mesmo quem está do lado de fora, o quanto demora para realizar uma audiência e o quanto demora para a conclusão de um processo. Nós entendemos que isso compromete o direito fundamental de acesso ao direito e à justiça”, realçou.
Segundo o presidente da AJA, entre os três poderes, o executivo, legislativo e judicial, o último “não está de facto firme”.
“Isso pode comprometer toda a estrutura do Estado e há necessidade de darmos a devida atenção para o poder judicial”, defendeu.
Sobre os últimos acontecimentos da justiça angolana dos últimos dias, que envolvem os juízes presidentes do Tribunal de Contas e do Tribunal Supremo, Esmael da Silva disse que a AJA “tem acompanhado com muita preocupação esse ambiente que se criou em torno do poder judicial”.
“Que as instituições vocacionadas a darem tratamento a cada um desses casos trabalhem e não o façam em silêncio, que comuniquem com o povo angolano, que quer saber o que é que se passa, respeitando os direitos dos envolvidos”, salientou.
Os nomes dos presidentes do Tribunal Supremo, Joel Leonardo, e do Tribunal de Contas, Exalgina Gambôa, têm sido citados nas últimas semanas como estando envolvidos em supostos casos de corrupção, peculato, entre outros crimes.
Exalgina Gambôa apresentou hoje a sua renúncia ao cargo, com a demissão apresentada esta manhã ao Presidente da República, João Lourenço, com conhecimento ao Conselho Superior da Magistratura Judicial.
A até hoje presidente do Tribunal de Contas e o seu filho, Hailé da Cruz, foram constituídos arguidos por crimes de extorsão e corrupção, segundo anunciou a Procuradoria-Geral da República (PGR) angolana na terça-feira, tendo o processo de inquérito sido aberto "em reação a informações e denúncias públicas".
Na segunda-feira, o Presidente angolano anunciou que convidou Exalgina Gambôa a renunciar ao cargo no dia 21 de fevereiro devido às várias “ocorrências” que a envolviam.
Questionado sobre de que forma a justiça angolana poderá recuperar a sua imagem face à crise que enfrenta, o presidente da AJA é de opinião que é possível, e para os casos em questão, o ordenamento jurídico angolano reserva mecanismos para solucionar qualquer crise.
“São esses mecanismos que devem ser colocados no campo para resolvermos certas crises”, disse Esmael da Silva, considerando que o “estado atual da justiça não é bom e carece de mais atenção”.
Por sua vez, o presidente do Sindicato Nacional dos Magistrados do Ministério Público, Adelino Fançony André, entende que “é preciso pensar-se profundamente no setor da justiça”.
“Entendemos que é o lugar em que cada cidadão angolano pode ser feliz, porque o principal objetivo da justiça é efetivamente fazer a justiça, dar a cada um o que é seu, dar a cada um o que merece, e para dar a cada um o que merece é preciso que os órgãos a quem foram atribuídas as responsabilidade de administrar a justiça estejam dotados de um conjunto de condições e pressupostos para efetivamente atribuir a cada cidadão aquilo que merece”, disse.
O protesto marcou a abertura do ano judicial, apesar de ter sido adiada a cerimónia oficial de abertura para nova data a anunciar.
As férias judiciais decorreram de dezembro do ano passado até hoje, período em que os tribunais estiveram fechados para trabalhos internos.