A eleição presidencial, que ocorreu a 08 de agosto, "não foi conduzida de acordo com a Constituição", disse o juiz presidente do Supremo Tribunal do Quénia, David Maraga.
"Sobre a questão de saber se as ilegalidades e as irregularidades afetaram a integridades da eleição, o Tribunal é da opinião que é este o caso".
A decisão de anulação das eleições, que é definitiva, foi aprovada pela maioria dos juízes e apenas dois foram contra, num total de sete (um esteve ausente por doença).
O juiz presidente do Tribunal disse que a Comissão Eleitoral "falhou, negligenciou ou recusou" conduzir as eleições de acordo com a Constituição, citando irregularidades na transmissão dos resultados.
De acordo com a agência de notícias Associated Press, o candidato da oposição, Raila Odinga, alegou que os votos eletrónicos tinham sido pirateados e manipulados a favor do Presidente Uhuru Kenyatta, que ganhou um segundo mandato com mais de metade dos votos.
Kenyatta foi declarado vencedor no passado dia 11 de agosto, com 54,27% dos votos, contra os 44,74% conseguidos por Odinga, que aos 72 anos se candidatava pela quarta vez, depois de ter sido derrotado em 1997, 2007 e 2013.
O anúncio da vitória de Kenyatta desencadeou dois dias de protestos e motins reprimidos pela polícia em bairros da lata de Nairobi e no oeste do país, bastiões da oposição.
Pelo menos 21 pessoas, entre as quais um bebé e uma menina de nove anos, foram mortos a 11 e 12 de agosto, quase todos pela polícia, segundo um balanço da agência noticiosa francesa France Presse (AFP).
Nesta semana os observadores e os países ocidentais pediram a oposição de aceitar resultado das eleições, que não viram as evidencias das fraudas e a organização não-governamental Human Rights Watch estimou que o escrutínio foi "marcado por graves violações dos direitos humanos, incluindo assassínios ilegais e espancamentos pela polícia em manifestações e operações de busca em casas do oeste do Quénia".
Um dia histórico para África
Reagindo à decisão do Supremo Tribunal, o candidato da oposição queniana às presidenciais, Raila Odinga, disse que hoje "é um dia muito histórico para o povo do Quénia e por extensão para o povo de África".
"Pela primeira vez na história da democratização africana, foi tomada uma decisão por um tribunal anulando a eleição irregular de um presidente. Esta é uma decisão que estabelece um precedente", adiantou.
Já o advogado que defendia a vitória do presidente cessante, Ahmednassir Abdulahi, disse que a decisão do Supremo é "política e não legal".
Por seu turno, o "número dois" da coligação opositora, Kalonzo Musyoka, considerou que "a dignidade e a integridade do Supremo Tribunal foram restabelecidas", mas disse ter dúvidas sobre a capacidade da Comissão Eleitoral para "organizar eleições livres, justas e credíveis".
Presidente do Quénia "discorda pessoalmente", mas respeita anulação das eleições
O presidente do Quénia, Uhuru Kenyatta, afirmou que "discorda pessoalmente" da decisão do Supremo Tribunal que esta sexta-feira anulou a sua eleição no mês passado, mas irá respeitá-la.
No entanto, Kenyatta criticou os juízes, afirmando que "seis pessoas decidiram ir contra a vontade do povo".
O presidente do Quénia falava esta sexta-feira ao país após o Supremo anunciar de manhã a sua decisão.
Comissão Eleitoral queniana pede calma à população perante novas eleições
O presidente da Comissão Eleitoral do Quénia pediu hoje calma aos cidadãos diante das novas eleições que deverão ocorrer em 60 dias, depois de o Supremo Tribunal de Justiça ter anulado o sufrágio de 08 de agosto.
"Apelamos aos quenianos a manterem a calma e a conterem-se para não minarem a estabilidade", afirmou Wafula Chebukati, recordando que o Supremo Tribunal ainda não tornou público o parecer detalhado e definitivo da sua decisão.
De acordo com o Tribunal, a Comissão Eleitoral do Quénia "cometeu irregularidades" durante as eleições "que afetaram a integridade do processo eleitoral".
Chebukati disse que a instituição eleitoral "tomou nota" das observações do Tribunal e irá fazer "mudanças internas de pessoal" necessárias para as próximas eleições.
O presidente do organismo eleitoral admitiu que "alguém tem de assumir a responsabilidade pelos erros cometidos", embora por enquanto tenha descartado a sua demissão, convidando ainda o Ministério Público a "investigar e a processar qualquer membro da Comissão Eleitoral" que tenha atuado ilegalmente.