A decisão do plenário, composto por 10 juízes não foi unânime, contando entre os votos vencidos os do juiz presidente, Manuel Aragão, e os dos conselheiros Carlos Teixeira, Josefa Neto e Maria de Almeida Sango.
O recurso extraordinário de inconstitucionalidade foi interposto por Augusto Tomás e restantes condenados do “caso CNC” (Isabel Ceita Bragança, Rui Manuel Moita e Manuel António Paulo) na sequência do acórdão do Tribunal Supremo que os condenou a penas entre dois meses e oito anos de prisão maior, multa e indemnização ao Estado pela prática de crimes de peculato e branqueamento de capitais.
Augusto Tomás, que entre 2008 e 2017 foi o titular da pasta dos Transportes, foi condenado por peculato, violação das normas de execução do plano de orçamento sob forma continuada, abuso de poder e participação económica, no caso do Conselho Nacional de Carregadores (CNC), órgão que na altura tutelava.
Os recorrentes, que apresentaram as alegações individualmente, requereram ao Tribunal Constitucional, que verificasse se o acórdão do Supremo violou os princípios de direito a um julgamento justo, direito à integridade pessoal, princípio de acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva, direito do processo equitativo, direito à liberdade física e pessoal, da presunção de inocência e direito de defesa, entre outros.
O acórdão de 52 páginas do Tribunal Constitucional não lhes deu razão, por considerar que as decisões “contêm fundamentos de direito que não padecem de inconstitucionalidades face aos princípios da legalidade e subordinação dos atos do Estado (Tribunais) à Lei Fundamental [Constituição]”.
Os juízes concluíram que o acórdão impugnado não violou os pressupostos elementares do Estado democrático e de direito, atinentes principalmente às garantias substantivas do processo penal, tais como o direito de acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva e o direito a um julgamento justo e conforme.
Na sua declaração de voto vencido, Manuel Aragão alegou que os princípios do direito a um julgamento justo “exigem uma máxima idoneidade de meios” e considerou que a “mitigação das formalidades” só é admissível quando necessária “a salvaguardar um outro direito processual fundamental”.
Neste caso, o juiz considerou que há elementos que “certificam a violação do princípio do direito ao julgamento justo”, o que fundamentou o seu voto contra o acórdão do Tribunal Supremo.
Maria de Almeida Sango, por outro lado, referiu na sua declaração que o Tribunal Supremo violou a possibilidade dos juízes do plenário que iriam decidir sobre o recurso interposto pelos recorrentes de estudar o processo, que contém mais de 28 volumes, nas condições adequadas, devido à exiguidade do prazo que foi determinado o que os impediu de decidir de forma conscienciosa.
A juíza disse que este acesso ao processo “não cumpre uma função meramente simbólica”, servindo para que possam estudar o processo e manifestar o seu sentido de voto de forma imparcial.
“Não restam dúvidas de que o prazo dado aos conselheiros para emitir o seu visto, não lhes permitiu formar um bom juízo de valor e tomar uma decisão justa”, escreveu a juíza, acrescentando que o acórdão “proferido por esta instância [Tribunal Supremo] vai na contramão e beliscou os direitos e garantias constitucionais dos recorrentes” pelo que deveria ser declarado inconstitucional.
Segundo Maria de Almeida Sango, o acórdão do Supremo é violador de vários princípios da Constituição, como o princípio da igualdade de armas, o direito à tutela jurisdicional efetiva, o princípio do contraditório e o direito ao julgamento justo e conforme.