Editores, âncoras e comentaristas apontam comentário sobre ‘países de merda’ como exemplo da visão do presidente sobre questão racial
As duas primeiras perguntas ficaram sem resposta e, na terceira, Trump se levantou e deixou a sala. “Senhor presidente, você é racista?”, questionou um repórter. E para grande parte da imprensa americana, a resposta é sim.
Em texto assinado pelo conselho editorial, o “New York Times” revela preocupações sobre os danos provocados por Trump à reputação internacional dos EUA. “Onde começar? Que tal uma simples observação: o presidente dos Estados Unidos é um racista. E outro: os EUA têm uma longa e feia história de exclusão de imigrantes com base na raça ou origem nacional. O senhor Trump parece determinado a desfazer os esforços feitos pelos presidente de ambos os partidos nas últimas décadas para superar essa história”.
O editorial vai além, citando que Trump negou ter usado o termo “países de merda”, apesar de diversos relatos de congressistas presentes à reunião, entre republicanos e democratas. “Claro que ele fez isso. Lembrem, o senhor Trump não é apenas racista, ignorante, incompetente e indigno. É também um mentiroso”.
Classificar uma personalidade como racista não é algo simples, sobretudo para a imprensa, que defende a isenção de opiniões, mas as últimas declarações de Trump foram um “ponto de virada” para muitos que ainda eram reticentes. Segundo escreveu John Cassidy em artigo na prestigiada revista “The New Yorker”, “os argumentos para se manter reticente parecem absurdos. A verdade óbvia não pode mais ser evitada: nós temos um racista no Salão Oval”.
Sunny Hostin, apresentadora do programa “The View“ e comentarista da “ABC News“, fez um depoimento emocionado, ressaltando que a família de seu marido é do Haiti. Sunny contou ter sempre resistido a chamara Trump como racista porque “não podia olhar em seu coração”.
— Eu posso dizer agora: Donald Trump é racista — disse Sunny, na edição de sexta-feira do “The View”. — Eu odeio dizer isso, mas posso dizer agora.
Na MSNBC, a apresentadora Rachel Maddow chamou Trump de “um presidente abertamente racista”. No “CNN Tonight”, o âncora Don Lemon questionou “quantos exemplos você precisa?” para considerar Trump racista. O correspondente da Casa Branca da emissora, Jim Acosta, comentou que Trump mantém um “padrão perturbador que parece apontar para uma verdade: que no fundo o presidente pode ser apenas um racista”.
No “Daily Show” do canal Comedy Central, Trevor Noah usou o humor para ilustrar sua opinião:
— Gente, eu não sei como contar isso para vocês — disse Trevor. — Mas eu acho que o presidente pode ser um racista.
Na Fox News, apenas ‘um erro’
Mas nem todos bateram o martelo se Trump é ou não racista. O vice-presidente da Associated Press John Daniszewski explicou que a agência pode citar alguém chamando outra pessoa de racista, “mas não faria a acusação na falta de prova incontestável”. Palavras e ações podem ser caracterizadas como racistas, mas a agência teria que mostrar na reportagem que elas estão baseadas apenas na raça.
Na conservadora Fox News, ninguém chamou Trump de racista, mas mesmo assim o presidente foi criticado. No “Fox & Friends”, programa matinal preferido por Trump, o apresentador Brian Kilmeade disse que “o presidente cometeu um erro ao fazer esse comentário”.
Tim Graham, diretor de análise de mídia do Media Research Center, considera que o termo “racista” está na moda no momento, mas não deve ser usado por jornalistas.
— É muito para um jornalista objetivo chamar o presidente de racista — disse Graham, à Associated Press. — Jornalistas podem, e provavelmente irão, notar que “críticos dizem” que as declarações têm uma conotação racista.
Já para o cineasta Michael Moore, os jornalistas devem “de agora em diante, quando se referirem a Trump, usar a palavra ‘racista’ para descrevê-lo”, considerou pelo Twitter.
Para o comentarista político da MSNBC Lawrence O'Donnell, parece que seus colegas estavam vivendo em outra realidade nos últimos seis anos.
“Para cada âncora e comentarista que descobriu ontem que Trump é racista, por favor expliquem porque não disseram isso seis anos atrás quando ele estava mentindo sobre a certidão de nascimento de Obama”, escreveu O’Donnell, no Twitter. “Eu o chamei de racista e mentiroso patológico na época. Vocês continuaram agendando mais entrevistas com ele”. G1