Conflito na RDCongo está a criar situação perigosa entre o Burundi e o Ruanda

Post by: 12 Fevereiro, 2025

Um analista do International Crisis Group disse hoje que o conflito na República Democrática do Congo pode escalar e criar uma situação perigosa entre Burundi e Ruanda, elogiou o papel mediador de Angola e pediu mais intervenção da União Africana.

A poucos dias do início da 38.ª Cimeira de chefes de Estado e de Governo da União Africana (UA), na qual Angola assumirá a presidência rotativa desta organização com 55 países, o diretor do lnternational Crisis Group para a região dos Grandes Lagos, Richard Moncrieff, defendeu que Angola tem agora uma posição mais difícil e exortou a UA a ser mais interventiva e a priorizar uma via de mediação única para resolver um conflito que ameaça estender-se a outros Estados.

O especialista falava num debate sobre as grandes prioridades da União Africana em 2025, promovido pela International Crisis Group, uma organização não-governamental virada para a resolução e a prevenção de conflitos armados internacionais, que incidiu sobre a escalada dos conflitos na RDCongo, Sudão e Camarões.

Richard Moncrieff salientou que o movimento rebelde M23, que luta contra o Governo da RDCongo e é apoiado pelo Ruanda, está a avançar no Kivu do Sul, depois de ter tomado a capita do Kivu do Norte (Goma), apesar das resistências do exército congolês e das tropas do Burundi, apontando a enorme fragilidade de Kinshasa neste momento.

"Tivemos relatos de jornalistas, não é informação minha, mas li isto, que Tshisekedi não está a viajar neste momento devido às suas preocupações com a segurança. Portanto, penso que isto sublinha a enorme fragilidade, tanto a nível regional como a nível da República Democrática do Congo", disse.

O especialista elogiou os esforços de mediação entre o Ruanda e a RDCongo liderados por Angola nos últimos dois anos e meio, iniciativa que se tornou mais difícil quando o Presidente do Ruanda faltou à Cimeira de Luanda, promovida pelo Presidente angolano, João Lourenço, em dezembro.

Richard Moncrieff considerou que a ausência pode ter sido uma antecipação do que veio a acontecer em Goma, tomada pelo M23 em finais de janeiro, e para um intensificar dos combates.

"Assim, Angola foi colocada numa posição um pouco mais difícil. É agora vista, talvez, como estando um pouco mais próxima de Kinshasa. Suspeito que os ruandeses estão a pressionar nesse sentido", destacou.

A isto juntam-se divisões regionais significativas no seio da União Africana, entre aqueles que simpatizam com o Ruanda e seguem a narrativa ruandesa de que estão a intervir na RDCongo por autodefesa e outras potências que são muito mais favoráveis à linha de Kinshasa e consideram que o país foi invadido e que se trata de um caso de agressão internacional, acrescentou o consultor.

"Estas são divisões profundas e importantes no seio das potências africanas. Muitas vezes, estão debaixo da superfície, mas quando as coisas aquecem, vemo-las subir à superfície (...). Penso que a conclusão lógica disto é que é uma prioridade para a União Africana chegar a um acordo e apoiar uma única via de mediação", sugeriu.

Reforçou que "os angolanos têm estado a fazer um bom trabalho em circunstâncias difíceis" e devem ser apoiados se pretendem continuar. Mas, perante as incertezas de quem vai estar envolvido, ressaltou a importância de uma única via de mediação.

Além disso, "é realmente importante impedir uma escalada mais alargada neste momento", alertou, comparando o conflito com o da década de 1990, porque o M23 "está mais profundamente enraizado e apoiado pelo Ruanda".

"O mais significativo é que os vizinhos estão a ser arrastados para esta situação. Estamos a assistir a uma situação muito perigosa entre o Ruanda e o Burundi. E isso deveria ser, de facto, uma grande preocupação para a União Africana. Trata-se de um problema entre Estados que a União Africana é mandatada para resolver. Não é Angola que tem esse mandato", defendeu.

Richard Moncrieff frisou que "é vital ultrapassar estas divisões internacionais e apoiar uma mediação única" e que os mediadores e seus parceiros devem chegar a acordo sobre as mensagens que precisam de ser transmitidas.

Adiantou que é importante pressionar o Ruanda para que recue no que se está a tornar uma guerra de agressão e que Kinshasa deve refletir sobre o que correu mal, nomeadamente em termos de colaboração com grupos armados, que coloca problemas a longo prazo.

Por outro lado, considerou a questão da negociação com o M23 como a mais problemática, havendo vários apelos a que Kinshasa negoceie com este movimento, o que o Governo de Tshisekedi tem recusado.

"De certa forma, reflete o equilíbrio de poder no terreno. Afinal de contas, o M23 acabou de tomar Goma e, nesse sentido, talvez seja melhor falar do que lutar", observou.

"Penso que, ao mesmo tempo, também é importante ter, pelo menos, algum respeito pelo ponto de vista de Kinshasa, segundo o qual o Ruanda é o verdadeiro mestre das marionetas, e isto também deve ser enquadrado como um problema diplomático", acrescentou, frisando que equilibrar estes elementos vai ser um dos desafios mais difíceis para a UA.

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