O relatório elaborado pelo Movimento Cívico Mudei, organização não-governamental angolana, compreende o período entre novembro de 2023 e janeiro de 2024 e incide sobre matérias publicadas pelo Jornal de Angola (JA), Televisão Pública de Angola (TPA), Rádio Nacional de Angola (RNA), órgãos estatais, e a TV Zimbo, canal privado que passou para a esfera do Estado angolano.
Segundo o relatório, consultado hoje pela Lusa, a agenda do Governo ocupou 48,6% do espaço noticioso destes órgãos, nomeadamente 63,8% das capas do JA, 48,6% no telejornal da TPA, 35,5% no telejornal da TV Zimbo e 46,8% nos noticiários das 13:00 da RNA.
Notícias sobre sociedade, desporto e de âmbito internacional ocupam as posições seguintes.
Para além do espaço central dado ao executivo angolano, “constata-se uma ausência de sentido crítico ou de contraditório”, refere o Mudei, salientando que “não são noticiadas quaisquer discordâncias ou erros da ação governativa”.
Em relação aos partidos políticos, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA, no poder) ocupou, no cômputo geral, 79,5% do espaço de antena monitorado nos referidos órgãos - TPA (88%), TV Zimbo (70%), JA (93%) e RNA (67%).
A União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA, maior partido na oposição), no geral, absorveu apenas 13% do espaço noticioso, nomeadamente, 7% na TPA, 24% na TV Zimbo, 7% no Jornal de Angola e 14% na RNA.
Em várias categorias (cultura, empresariado, sociedade civil e outras) “nota-se uma tendência para se adotar uma perspetiva de realce da presença e papel do executivo ou de organizações e indivíduos que lhe sejam próximos”, observa o Mudei.
A ONG considera também ser “notável”, nesses órgãos, o limitado espaço e/ou omissão dada às organizações sindicais, movimentos reivindicativos ou a organizações da sociedade civil no decurso dos meses de novembro e dezembro de 2023 e janeiro de 2024.
Este trabalho de monitorização, que consistiu em observar (visualizar, escutar e medir) e classificar os principais noticiários da TPA, TV Zimbo e da RNA e as capas do JA, constatou que o Jornal de Angola e a TPA “destacaram-se no desequilíbrio de tratamento aos diferentes atores políticos”.
A análise conclui que as redações dos referidos órgãos e a respetiva tutela revelam uma visão hegemónica no exercício do poder e do direito ao discurso público e salienta que os princípios básicos de jornalismo, como o direito ao contraditório, são “sistematicamente ignorados”.
A linha editorial dos órgãos monitorizados – “em especial do Jornal de Angola e da TPA - parecem mais a de um órgão de relações públicas do Governo do que de um órgão de imprensa ao serviço do público, com o objetivo de o informar”, conclui o Mudei.
O relatório inscreveu a análise de um total de 4.807 notícias, nomeadamente 590 do Jornal de Angola, 1.011 da RNA, 1.689 da TPA e 1.517 da TV Zimbo.
O Mudei, que promete publicar regularmente relatórios trimestrais de monitorização, considerou ainda neste documento, datado de 30 de maio, que a comunicação social é um dos pilares incontornáveis de um processo político aberto e plural.