Falar por telemóvel deixou de ser prática exclusiva de uma minoria em Angola. Hoje, mais de metade da população angolana (estimada em 25 milhões de habitantes - Censo 2014) usa esse recurso tecnológico, para encurtar distâncias e ligar-se ao mundo.
Em várias localidades do país, o telemóvel atrai, diariamente, milhares de idosos, adultos, jovens, adolescentes e crianças. Poucos se imaginam a viver sem o qual à mão.
O mercado registou, nos últimos 10 anos, acréscimo considerável de utilizadores. Segundo dados de 2011, “em cada 100 habitantes em Angola, sessenta e quatro já usam telemóvel”.
Essa realidade é fruto da expansão do sinal em várias regiões, do aumento de utilizadores e dos investimentos das operadoras credenciadas, nomeadamente, Unitel e Movicel.
De acordo com o Instituto Nacional das Comunicações (Inacom), 11 milhões, 396 mil e 238 cartões “SIM” (chip), dos mais de 14 milhões adquiridos, foram registados no circuito oficial, até 2017. Isso corresponde a 81,4 por cento dos números activos.
Os dados do Inacom, referentes a 2016, indicam que 73 por cento do mercado - pelo menos 10 milhões de clientes - é dominado pela Unitel, contra 27 da Movicel, que se estima ter uma rede de pelo menos três milhões e 780 clientes.
Juntas, as duas operadoras disputam um mercado que ainda está longe de corresponder aos anseios de milhares de utilizadores, em termos de serviços e qualidade do sinal.
Apesar da aposta constante das operadoras nos novos produtos, os clientes lamentam o facto de, nos últimos anos, o custo da comunicação "estar cada vez mais caro".
Em determinadas zonas do país, queixam-se por as tarifas terem sido aumentadas, mas a qualidade do sinal continua aquém do esperado.
Os clientes exigem melhorias substanciais nos serviços e dizem-se satisfeitos com a possibilidade de entrada no mercado de novas operadoras, já a partir de 2018.
Sacrificar o bolso
Diariamente, usuários de vários escalões buscam soluções alternativas para se adaptar às novas tarifas e reduzir o impacto das debilidades no sinal de rede. Para muitos, o uso de duas operadoras afigura-se, no actual cenário, como a medida mais ajustada.
Um, em cada cinco clientes ouvidos pela Angop, entende que o uso das duas operadoras é necessário, apesar de encarecer os custos, sobretudo no domínio da recarga de saldo.
Os utentes apontam, como principais constrangimentos, o custo das chamadas telefónicas, a má qualidade do sinal de rede, as quebras constantes do sinal de Internet (dados móveis) e, em alguns casos, a lentidão dos serviços de atendimento ao cliente.
É com esse “mar” de dificuldades que os usuários convivem regularmente, na esperança de haver dias melhores e de ter uma rede de comunicação mais eficiente.
Mário Mário, utente de telemóvel há 16 anos, afirma que, no actual contexto do mercado de telefonia, fica mais em conta ser cliente das duas operadoras em serviço.
“Só dessa forma é possível ter um serviço mais abrangente”, declara.
A seu ver, qualquer uma das duas operadoras em serviço no mercado não oferece garantias totais de comunicação eficiente, sobretudo ao nível da qualidade do sinal.
"A Unitel está melhor que a Movicel, em termos de sinal de rede", comenta o utente, sublinhando, em contrapartida, que usa também a Movicel, por ter tarifário inferior.
Raimundo Nené também usa as duas redes e diz que, em termos de chamadas de voz, a Unitel está melhor, uma vez que, em muitas zonas do país, não chega o sinal da Movicel.
"A Unitel tem rede em qualquer ponto do país", comenta o cidadão, que ressalta, em contrapartida, as vantagens do plano mensal da concorrente Movicel.
Em relação ao atendimento ao cliente, Raimundo Nené diz que a Unitel está melhor.
João Fausto, que usa a rede Movicel há nove anos, diz que a sua operadora mudou um pouco nos últimos anos, apesar de implementar o “Plano Mensal”.
Ainda assim, ressalta o facto de a operadora ter um serviço de "melhor qualidade" que o da concorrente, em termos de dados.
Quem também se queixa dos serviços é o usuário Carlos Maombo, para quem as tarifas estão altas e são desproporcionais à qualidade do serviço prestado pelas operadoras.
UTT mais cara
O preço da Unidade de Taxa de Telecomunicações (UTT) sofreu reajustes ligeiros, confirmados no final de 2016, pelo Ministério das Telecomunicações e Tecnologias de Informação. Com essa medida, os utilizadores dos serviços de telefonia e inerentes passaram a pagar mais 2,8 Kwanzas (Kz) por cada UTT.
O preço do tarifário saiu de 7,2 Kz para 10, impactando no custo das recargas.
Nesse sentido, o cartão de recarga da Unitel (de 125 UTT), que custava 900 Kz, passou a ser vendido a 1.250 Kz, um aumento de 38,88 por cento.
Segundo especialistas em telecomunicações, a operadora passou a "reduzir o tempo de chamadas de voz e navegação na Internet", para se ajustar à nova realidade.
Enquanto 1 UTT custa 7,2 Kz, referem, "ao falar por um minuto, o cliente da Unitel gasta 3 UTT, o equivalente a 21,6 Kz (se for para a mesma rede), e 25,92 Kz para rede diferente".
Quanto ao cliente da Movicel, "desembolsa até 25 Kz, isto é, 3,47 UTT num minuto".
O aumento do tarifário agravou a situação dos clientes em Angola, que já figurou na lista dos piores países da África Subsariana em termos de preços de telecomunicações.
Essa alteração repercute, além do serviço de voz, nos serviços de dados (Internet).
Como exemplo, 500 mb de Internet custam, em Angola, aproximadamente 1800 Kz, quase 8 USD (câmbio oficial). Esta tarifa está acima da cobrada na África do Sul, Namíbia, Tanzânia, Moçambique e Botswana, para chamadas de voz e de dados.
De acordo com estudos, com 2,16 dólares, por exemplo, o utente compra 500 mb em Moçambique, enquanto um minuto de chamada custa 11 cêntimos de dólar por minuto.
Na Namíbia, vende-se 500 mb por 5,93 dólares, e 7 cêntimos o minuto de voz. Já na África do Sul, 500 mb custam 5 dólares e as chamadas de voz são 4 cêntimos/minuto.
Para contrapor esses números, o Executivo angolano está a trabalhar, a fim de reduzir as tarifas dos serviços de comunicação, com a aplicação de medidas que levam à redução dos preços dos serviços das comunicações em relação aos últimos cinco anos.
Os clientes das duas operadoras em Angola dizem estar a acompanhar essas medidas do Executivo, que prevê ter resultados satisfatórios, com a entrada em funcionamento do Angosat 1, mas sublinham a necessidade de se melhorar a qualidade do sinal de rede.
Fernanda Domingos, usuária da Unitel há mais de seis anos, diz que a operadora, em questões de dados de Internet, deve melhorar as tarifas, porque estão muito altas.
Já Denilson Ferraz entende que a operadora Unitel tem muitos aspectos positivos no seu serviço, mas deve melhorar no serviço de apoio ao cliente.
Por sua vez, Faustino Soares, usuário das duas redes, admite que a Movicel facilita os utentes na questão de saldo de dados e voz, por causa do serviço “Plano Mensal”.
O cliente lamenta o facto de, na Unitel, as pessoas conversarem pouco tempo, porque o saldo quase não demora. Por isso, pede melhorias neste aspecto.
A cliente Maria Nunes é mais incisiva e afirma que a qualidade do serviço de Internet da Unitel está mal, tendo uma das tarifas mais altas do mercado.
Em contrapartida, Gisela Canga discorda e diz que os serviços da Unitel estão a melhorar.
A cliente, que já leva seis anos com a operadora, é de opinião que a Unitel baixe as tarifas, pois acredita ser "um roubo, principalmente o saldo de dados".
Wilson Neto tem o mesmo entendimento e diz que a operadora tem um serviço caro que dificulta nos custos e cria constrangimentos aos clientes.
AADIC atenta ao problema
A Associação Angolana dos Direitos do Consumidor (AADIC) está atenta ao problema.
Dados oficiais a que a Angop teve acesso referem que, semanalmente, seis reclamações contra as duas operadoras dão entrada, em média, naquela instituição.
O presidente da AADIC, Diógenes de Oliveira, refere que as principais reclamações têm a ver com queda do sinal de internet, custo e má qualidade das chamadas, sobretudo no cruzamento de uma rede para outra.
O que mais inquieta os clientes, informa, é a suposta "falta de transparência das operadoras" para com os mesmos, no que toca ao prazo das recargas telefónicas.
"Normalmente, quando se faz uma recarga telefónica, tem-se em mente que a mesma vele por um mês. Mas antes dos 15 dias termina, sobretudo quando se trata de recarga de dados. Já têm a Internet muito lenta e não se consegue fazer mais nada", reclama.
Quanto ao saldo de voz, diz ser a queixa mais complicada, em virtude de haver usuários que reclamam por ver, após duas ou três chamadas, o fim do saldo.
Sublinha, igualmente, que muitos clientes se queixam do facto de, quando se ausentam do país com o telemóvel carregado, não encontrarem o saldo ou encontrarem o número bloqueado.
Para ajudar a solucionar esses casos, o responsável diz que a AADIC está a analisar as questões, para, junto das operadoras, tentar resolvê-las.
A respeito das críticas, a Angop procurou ouvir responsáveis das agências da Movicel e da Unitel, mas todos se recusaram a prestar declarações.
A Movicel declarou, recentemente, que está preparada para enfrentar o desafio que se segue de quatro empresas de telefonia a operar em Angola.
Em comunicado tornado público em Janeiro último, a empresa esclarece que optou, no âmbito da sua estratégia comercial para 2018, por reformular os planos antigos, em virtude de já não se adequarem às necessidades de comunicação dos clientes.