DW África: É acusada de ter entrado na chefia da Sonangol, apenas porque era filha do então Presidente...
Isabel dos Santos (IS): Quando eu fui para a Sonangol, eu vinha do setor privado. Nessa altura, eu já tinha muitas empresas. E quero frisar que as minhas empresas não foram feitas com o erário público. A minha empresa mais bem sucedida é a Unitel, que não foi feita com ajuda do erário público. A Unitel gerou dividendos. Eu peguei nesses dividendos e voltei a investir. Investi num banco, criei um banco. Mas foi com os dividendos que eu ganhei com as minhas empresas e com empréstimos bancários. Quando cheguei à Sonangol, encontrei muitas coisas erradas. Todos nós temos conhecimentos dos desvios que havia antes na Sonangol, os desvios dos administradores, dos diretores... A Sonangol sempre foi um local de roubo. Ninguém fala do que se passou na Sonangol antes de eu entrar na Sonangol. Ninguém questiona o que que foram aqueles prédios, que foram construidos, os condomínios, os aviões da Sonagol que foram comprados, esses negócios todos! Ninguém fala!
DW África: Usou informações privilegiadas da Sonangol para benefício próprio?
IS: Não, nunca fiz isso. É preciso saber que eu estive na Sonangol desde junho de 2016 até novembro de 2017. Estive lá 18 meses. Estava grávida, estava à espera do meu filho, e, para além disso, passei a reestruturar uma empresa que estava mal, sem dinheiro e com muitas dificuldades. Nunca usei dinheiros da Sonangol, nem abusei da minha posição e do meu cargo para benefício próprio.
DW África: Como pessoa politicamente exposta, como evitava a promiscuidade entre os negócios privados e os negócios estatais?
IS: Nunca evitei ser politicamente exposta, esse é um estatuto que infelizmente ou felizmente vem da família. O meu pai foi Presdente durante muitos anos, então eu sempre cresci politicamente exposta. Tudo o que eu fiz na vida foi sempre muito escrutinizado. As pessoas queriam ter a certeza que o dinheiro não vinha do Estado. Ao contrário do que as pessoas pensam, eu fui sempre muito controlada e politicamente exposta. É mais difícil para uma pessoa como eu fazer negócios, não é mais fácil. Mas eu consegui provar que o dinheiro que eu ganhei para constituir as minhas empresas vinha dos meus dividendos da Unitel, do banco BIC, etc., e vinha também de empréstimos bancários.
DW África: Acha que a Justiça angolana foi justa consigo?
IS: Infelizmente, e isso é uma coisa que me põe triste, o meu país não tem justiça. O nosso país não é um Estado democrático de direito. É um país em que as leis não são cumpridas. O sistema judicial em Angola não é independente. Antes disto me ter acontecido, eu não tinha noção da gravidade deste problema, mas hoje em dia tenho. Hoje em dia sei que em Angola se violam os direitos humanos. Confesso que, antes disto, eu também não sabia.
DW África: Porque é antigamente não tinha essa noção?
IS: Em toda a minha vida eu me pautei pela lei. Nunca tive problemas contratuais ou problemas de legalidade. E hoje também não os tenho. O que eu hoje enfrento é uma perseguição política. O Presidente João Lourenço decidiu transformar a família dos Santos numa espécie de símbolo. Ele quer provar ao mundo que o Presidente dos Santos era um mau Presidente, e que os filhos são culpados. Isso é uma agenda de perseguição política, porque não há factos.
DW África: João Lourenço está a persegui-la?
IS: Eu acho que toda esta campanha foi montada para desacreditar a minha obra. Quando se diz que eu desviei dinheiro da Sonangol, quer-se, no fundo, justificar a nacionalização da Unitel.
DW África: Voltaria a investir em Angola?
IS: Eu acho que Angola precisa de um Governo que esteja à altura. O partido que está no poder não é o partido certo para gerir as expetativas dos angolanos. É o que hoje acredito. O MPLA tornou-se um partido corrupto e desrespeitador das leis. Enquanto tivermos esse partido no poder, não haverá investimento em Angola.
DW África: Acabámos de assistir a eleições ganhas pelo MPLA. O povo acredita no MPLA?
IS: Eu estou fora do país e não votei sequer. Eu hoje não tenho condições para viver em Angola. Eu, em Angola, não posso ter salário. Não posso pagar a água, não posso pagar renda, porque a Procuradoria Geral da República proibe que eu tenha um kwanza para poder comprar comida, comprar luz, comprar água. Em relação ao resultado eleitoral, acho que o resultado não foi claro. Houve um momento em que se pediu para serem publicadas as listas, mas as listas não foram publicadas. Eu acho que se se tivesse publicado as listas, hoje poderíamos dizer com mais confiança quem ganhou e quem não ganhou as eleições.