Nos Países Baixos, onde foi recentemente condenada pelo Tribunal de Amesterdão por alegado “descaminho” de 52,6 milhões de euros da Sonangol, com recurso a documentos falsificados, a empresária angolana é representada juridicamente por quatro escritórios de advogados. Trata-se dos escritórios Van Doorne, OSK de Amsterdão, Pels Rijcken e CMS Derks Star Busmann, sedeados nesta cidade holandesa, que a defendem em diferentes processos de fórum cível e administrativo.
Alguns deles já terão cessado os contratos. No entanto, os resultados alcançados até ao momento, no caso que já foi julgado em tribunal de primeira instância, a sentença, tornada pública, não foi do seu agrado. No processo dos 52,6 milhões de euros, cuja decisão é passível de recurso, a empresa holandesa Esperaza Holding, de Isabel dos Santos, é defendida pelo advogado Jurjen de Korte, da OSK Advocaten.
Este advogado holandês ingressou neste escritório em 2017, depois de ter trabalhado em Abu Dhabi (nos Emirados Árabes Unidos, país em que Isabel dos Santos se encontra) e nos Estados Unidos da América (EUA). Terá pesado para a sua contratação o facto de ter uma vasta experiência na resolução de disputas internacionais, com foco em arbitragens comerciais internacionais, algumas delas envolvendo empresas ligadas ao sector de petróleo e gás, e serviços financeiros.
Entretanto, no seu vasto currículo profissional, a que OPAÍS teve acesso, ressalta que defendeu o antigo proprietário de um dos maiores bancos da Rússia, país em que Isabel dos Santos nasceu, em processos relativos ao reconhecimento nos Países Baixos de mais de 40 mil milhões de RUB e USD 505 milhões em decisões judiciais russas. De acordo com o Tribunal de Amsterdão que julgou este caso, foi este sócio do escritório de advogado OSK que apresentou um documento que foi classificado de falso.
Especialistas em “salvar” presumíveis criminosos de colarinho branco A equipa de advogado da Van Doorne tem Isabel dos Santos como uma das suas principais constituintes, pois representam as suas empresas em várias “frentes de batalhas judiciais” e não só. Para o efeito, tem Rogier Schellars e Bas van Zelst, jurista e professor da Universidade de Maastricht, como o rosto que se destaca no tribunal e na imprensa, quando o assunto está relacionado com as empresas que estão a ser defendidas por esse escritório.
A Van Doorne, com cerca de 200 advogados e mais de 90 anos de existência, apresenta-se como perita em resolução de crimes de “colarinho branco”, fraude, fundos de investimentos entre outros. Ela lidera o ranking de empresas especializadas em defender crimes de colarinho branco, nos Países Baixos. “Representamos e assessoramos empresas de diferentes sectores com relação a todos os aspectos de fraude financeira, corrupção, sanções económicas e combate à lavagem de dinheiro”, lê-se no seu portefólio, a que OPAÍS teve acesso.
Outros dos factores que terão contribuído para que Isabel dos Santos requisitasse os serviços da Van Doorne prendem-se com o facto de este se apresentar como capaz de prestar assessoria a uma ampla gama de empresas e indivíduos (membros de conselho de administração de empresas públicas e privadas, políticos e figuras públicas) quando as suas carreiras e futuros estão em risco.
A escolha de Bas van Zelst, sócio do referido escritório, para encabeçar a equipa encarregue de tratar dos assuntos daquela que já foi classificada pela revista Forbes como uma das mulheres mais ricas de África, deveuse também, entre outros factores, à sua experiência na condução e assessoria em arbitragem comercial nacional e internacional, bem como em procedimentos complexos perante os tribunais comuns. No seu currículo profissional, a que OPAÍS teve acesso, consta que é um exímio condutor de processos relacionados com questões
de investimento e de apreensões transfronteiriças. “A sua linha de defesa centra-se na resolução de conflitos transfronteiriços, com particular ênfase na arbitragem”, lê-se no documento. Na lista de defensores de Isabel dos Santos nos Países Baixos consta ainda o advogado Jeroen Berlage, do escritório CMS Derks Star Busmann. Este especialista em transacções internacionais, contencioso e arbitragem, com créditos firmados no seu país, tem mais de 20 anos de experiência em processos dessa natureza. O escritório CMS é considerado um dos maiores escritórios de advocacia do mundo, com 79 escritórios espalhados por 44 países e 75 cidades.
Para atender a demanda, conta com uma equipa de mais de 5 mil advogados. Já a Pels Rijcken é considerada como um dos principais escritórios de advocacia da Holanda e conta com uma representação em Haia. Um professor catedrático e o ex-vice-presidente do PSD asseguram a defesa em Portugal Portugal é dos países, atendendo a proximidade com Angola, onde Isabel dos Santos mais contratou escritórios de advogado para defenderem os seus interesses em diferentes fases da sua vida.
Neste momento, que está a viver a mais conturbada, fruto dos processos de apreensões, arrestos e nacionalização dos seus bens, contratou os serviços do professor catedrático Germano Marques da Silva e do ex-vicepresidente do PSD, Marco António Costa. Este último foi deputado e, no governo, já exerceu os cargos de secretário de Estado Adjunto do Ministro da Segurança Social, Família e Criança e secretário de Estado da Solidariedade e da Segurança Social. Já Germano Marques da Silva concilia a docência e a advocacia com o desenvolvido de investigação nas áreas do Direito Penal e Direito Processual Penal, Direito Penal Económico e Direito Penal Tributário.
Tem manuais publicados em todas estas áreas. Em França, Isabel dos Santos recorreu aos serviços da dupla Philippe Pinsolle e Isabelle Michou para representar a sua empresa Vidatel, num processo que correu os seus trâmites no Tribunal Arbitral da Câmara de Comércio Internacional, com sede em Paris. Neste caso, a dupla de advogados também não conseguiu livrar a sua constituinte de uma pena que consiste no pagamento à PT Ventures, adquirida pela Sonangol, de 339,4 milhões de dólares, acrescidos de 364 mil euros por despesas judiciais.
Um escritório num caso de mais de 400 milhões de dólares
Em Londres, a empresa holandesa Unitel International Holdings (UIH), de Isabel dos Santos, litiga em tribunal com a Unitel, está a ser defendida por Richard Hill, do escritório White & Case. Apesar de contar com 25 anos de experiência, este advogado está a tentar livrar a sua constituinte, em recurso interposto no Supremo Tribunal de Londres, da pena de pagamento de 400 milhões de dólares à referida operadora de telecomunicações angolana.
O dinheiro resulta de um empréstimo e os respectivos juros que a Unitel emprestou a Isabel dos Santos para financiar a aquisição de acções de empresas de telecomunicações pela UIH, em 2012 e 2013, na época em que a empresária era sua directora.
Por não ter sido ressarcida, a Unitel processou a UIH em 2020 e, este ano, o referido tribunal aventou a possibilidade de ela ser arrolada, pessoalmente, no processo, além da sua empresa. De acordo com dados a que OPAÍS teve acesso, Richard Hill presta assessoria em processos e contratos de compras, investidores e credores. Além do Reino Unido, já trabalhou em diversos países da Europa, África do Norte e Subsahariana.
Sérgio Raimundo, o “guardião” em Angola
Sérgio Raimundo, um dos advogados mais prestigiados do nosso mercado, cumpre a difícil missão de defender na justiça angolana os interesses da empresária Isabel dos Santos, provando que constituiu o seu império sem infringir as leis que regulam o sector empresarial público e privado
Conta com uma equipa de suporte na qual despontam os advogados José Carlos, Patrícia Faria, José Faria, António João, Ntoni Tomás, Paulo Paixão, Vanessa Nobre Miguel e outros. Actualmente, o seu escritório, com representações nas províncias de Luanda, Benguela, Huíla e Cabinda, conta com uma vasta equipa de advogados.
Este causídico tem ainda à mesa alguns dos processos-crimes mais mediáticos, como o dos generais Manuel Hélder Vieira Dias e Leopoldino Fragoso do Nascimento, antigo ministro de Estado e Chefe da Casa de Segurança do Presidente da República, e ex chefe do Serviço de Comunicação do então Presidente da República, rescpectivamente. É o defensor do então governador do Banco Nacional de Angola, Valter Filipe, e do empresário ango-suíço Jean-Claude de Morais Bastos, antigo responsável pela gestão de activos do Fundo Soberano de Angola. Na jurisdição militar, “onde navega” com a mesma perícia que o faz noutras áreas, defendeu o general Zé Maria, ex-chefe do Serviço de Inteligência Militar, e o então comandante-provincial de Luanda, Joaquim Vieira Ribeiro “Quim Ribeiro”.
Fez parte da equipa de advogados de diferentes escritórios que defendeu o antigo ministro dos Transportes, Augusto Tomás. Os três já estão em liberdade. Além da advocacia, Sérgio Raimundo dedica-se também, há vários anos, a contribuir na formação daqueles que decidem fazer o curso de direito nas universidades Agostinho Neto e Católica de Angola.
Porém, a sua dedicação à formação de quadros angolanos começou muito antes, inicialmente como alfabetizador na Frente Militar Leste de Angola e, mais tarde, na antiga Escola de Formação Político-Militar Comandante Gika, em Luanda. Para Sérgio Raimundo, conforme afirmou em diversas ocasiões, o combate à corrupção não é feito apenas com decisões condenatórias, pelo facto de a justiça não ser apenas realizada com decisões do género. Mas, também, com decisões absolutórias.
Outrossim, defende que o combate à corrupção será mais eficaz se, inicialmente, forem atacadas as causas (da corrupção) e não apenas os efeitos, por considerar que assim estar-se-á “a tapar o sol com a peneira”. No seu ponto de vista, só deste modo será possível fazer-se uma “justiça, justa, em que se dê a Deus, o que é de Deus, e a César, o que é de César”.
De realçar que na lista de defensores dos interesses de Isabel dos Santos está também o advogado Walter Tondela, que tem sobre a mesa um processo movido pelo Estado angolano contra empresas de Sindika Dokolo, seu esposo. Este advogado notabilizou-se na defesa de alguns dos integrantes do processo 15+2.
Inglaterra: a suposta “lavandaria” do dinheiro para pagar advogados
A origem do dinheiro que Isabel dos Santos tem usado para pagar os honorários dos seus defensores tem levantado suspeições, pelo facto de algumas das suas contas bancárias e das suas empresas estarem congelas por ordem da justiça. Recentemente, foi tornado público que está a pagar aos advogados com dinheiro de uma empresa, sediada no Dubai, que facturou uma elevada quantia financeira com a venda de diamantes provenientes de minas em Angola. Trata-se da empresa Nemesis, pertencente ao grupo Odyssey, uma offshore criada há 9 anos por Sindika Dokolo, o falecido marido de Isabel dos Santos. Estes dados constam de uma investigação do Expresso, da SIC e do jornal holandês NRC, com recursos a documentos que mostram como a empresária está a contornar o arresto das suas contas bancárias em vários países.
Documentos a que os dois órgãos de comunicação social portugueses tiveram acesso mostram que, só entre 2016 e 2018, a Nemesis revendeu cerca de 250 quilos de pedras preciosas que tinha comprado a baixo preço. Entre eles, estava o “4 de Fevereiro”, o maior diamante encontrado nas minas de Angola, que tem 404 quilates. Segundo a investigação, é com parte desses lucros que Isabel estará agora a pagar aos seus advogados. Para o efeito, a Nemesis estabeleceu pelo menos dois acordos para a atribuição de linhas de crédito, cada uma delas até dois milhões de euros, para suportar os custos dos advogados holandeses contratados pela Exem – a sociedade de Isabel dos Santos. Há ainda um terceiro contrato, em que a Nemesis, entretanto renomeada de Naxos, assume os pagamentos de um processo interposto por Isabel dos Santos no Tribunal de Arbitrage. OPAIS