Defesa diz que processo contra generais angolanos partiu de “equívoco”

A queixa que deu origem ao processo foi apresentada em 2020 à Procuradoria-Geral da República (PGR) pela então ministra do Ordenamento do Território e Habitação e atual titular da pasta do Ambiente, Ana Paula Chantre Luna de Carvalho.

A defesa dos generais angolanos alega que o processo judicial contra Leopoldino do Nascimento ("Dino") e Hélder Vieira Dias Júnior ("Kopelipa") terá tido origem num "equívoco" relacionado com os terrenos onde foram construídos imóveis do CIF Angola, em Luanda.

Em causa estão edifícios localizados na urbanização Vida Pacífica (Zango/Viana) e que terão sido indevidamente referidos como integrando a reserva fundiária do Estado e construídos com fundos públicos, o que é contestado pela defesa.

A queixa que deu origem ao processo foi apresentada em 2020 à Procuradoria-Geral da República (PGR) pela então ministra do Ordenamento do Território e Habitação e atual titular da pasta do Ambiente, Ana Paula Chantre Luna de Carvalho.

De acordo com documentação a que a Lusa teve acesso, a ministra reportou ao Presidente da República, João Lourenço, uma "presumível usurpação" de unidades habitacionais edificadas no âmbito do Programa Nacional de Urbanismo e Habitação (PNUH), com fundos públicos, em terrenos do Estado.

Segundo essa comunicação, o CIF terá edificado 47 edifícios na Vida Pacífica, dos quais 24 foram ocupados num processo coordenado pela SONIP (empresa do grupo Sonangol) e os restantes 23 "técnica e administrativamente abandonados".

A ministra alertava também para o facto de terem sido encontradas 837 vivendas e 271 edifícios em diferentes fases de construção, com obras paralisadas, e salientava que o CIF solicitou a concessão do direito de superfície 'a posteriori', em terrenos públicos.

Na mesma nota indicava-se que as construções ocorreram sem os devidos licenciamentos e que as empresas envolvidas eram as mesmas que participaram na construção de imóveis do Estado. Com base nesses elementos, o executivo determinou o uso de mecanismos legais para recuperar o património e revertê-lo a favor do Estado.

Contudo, fonte da defesa dos generais afirma que houve "um equívoco", alegando que os imóveis referidos na queixa da ministra não se encontram na mesma localização dos que foram efetivamente construídos pelo CIF.

"Mesmo que assim fosse, havia prevalência de direitos já adquiridos pelo CIF", argumenta a mesma fonte, segundo a qual nenhuma das testemunhas ouvidas até ao momento corroborou a tese de que esses edifícios são públicos.

"Nem mesmo o Ministério Público trouxe para o processo qualquer prova documental ou outra nesse sentido", acrescentou.

O julgamento dos generais decorre desde março de 2024, à porta fechada, por decisão da juíza da causa, que interditou a presença de jornalistas durante a fase de produção de prova.

O processo decorre no Tribunal Supremo tendo sido ouvidos até 27 de junho os depoimentos de várias figuras ligadas ao Estado e à antiga estrutura da Sonangol e do Ministério da Habitação, incluindo Ana Paula Chantre Luna de Carvalho, Carlos Feijó (jurista e ex-ministro de Estado e da Casa Civil de José Eduardo dos Santos), Ernesto Garcia (antigo diretor da Unidade Técnica de Investimento Privado que supervisionava e coordenava grandes projetos de investimento no governo de José Eduardo dos Santos) e Francisco de Lemos José Maria (antigo presidente do Conselho de Administração da Sonangol, nomeado após a saída de Manuel Vicente), entre outros.

As audiências estão a decorrer à razão de três sessões por semana, estando prevista hoje nova sessão.

Dino e Kopelipa, ambos figuras próximas do ex-Presidente José Eduardo dos Santos, respondem por crimes como peculato, tráfico de influências e branqueamento de capitais, entre outros.

"Kopelipa", antigo chefe das secretas angolanas, "Dino", e mais cinco arguidos, incluindo três empresas, estão a ser julgados no âmbito de um processo que envolve a filial angolana da China International Fund (CIF), Plansmart International Limited e Utter Right International Limited, alegadamente usadas pelos arguidos para montarem um esquema que lesou o Estado angolano em milhões de dólares, envolvendo um acordo de financiamento entre Angola e China para apoiar a reconstrução nacional, após a guerra civil que terminou em 2002.

Em 2020, os dois antigos homens fortes de José Eduardo dos Santos tiveram de entregar ao Estado várias empresas e edifícios detidos pela CIF e pela Cochan, S.A., incluindo fábricas de cimento e cerveja, uma rede de supermercados e edifícios de habitação.

Não consta entre os arguidos o ex-vice-Presidente de Angola e antigo líder da Sonangol, Manuel Vicente, cujo nome está também ausente da lista com mais de 30 testemunhas, apesar de ser citado no processo, no âmbito das suas ligações à CIF.

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