Em entrevista à Lusa, o representante da Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP) em Luanda, Miguel Fontoura, explica que não é possível determinar um montante exato para dívida certificada – ou seja a que é reconhecida pelo Estado angolano –, devido aos efeitos cambiais, tendo em conta que uns contratos foram celebrados em dólares, outros em kwanzas e outros em euros, mas é “certamente superior a 500 milhões de euros”.
Do valor certificado, o montante que foi efetivamente pago, também é não fácil de contabilizar pois “há pagamentos em espécie, através de créditos fiscais e de obrigações do tesouro, mas andará à volta de 70 a 75%", estimou.
Miguel Fontoura destacou o “esforço sério” do executivo angolano no sentido de “ir desbastando esta dívida”, com progressos “consideráveis”, apesar das dificuldades causadas pela pandemia de covid-19 e pela crise económica, com Angola a viver o seu sexto ano de recessão consecutivo.
“Apesar de isto complicar a tesouraria das empresas portuguesas, essas empresas nunca puseram em causa o estar em Angola e compreendem que com dificuldade, mas com seriedade, as coisas vão ser resolvidas”, declarou à Lusa o responsável da AICEP, dizendo que “não é expectável que tudo se resolva da noite para o dia”.
Sobre os créditos que poderão ser recuperados no próximo ano, afirmou que é difícil antecipar pois vai depender do impacto de três variáveis: o facto de o país ir viver um ano eleitoral e o novo acordo que as autoridades angolanas poderão vir a celebrar com o Fundo Monetário Internacional (FMI), mas, sobretudo, o preço do petróleo, que poderá dar mais ou menos folga para que o Estado angolano vá regularizando as suas dívidas.
Assinalou ainda que o Estado angolano nunca pôs em causa o pagamento da dívida certificada.
Quanto à não certificada, o problema é mais complexo, admite. Há dívidas contraídas por empresas públicas e órgãos da administração local, dívidas com contrato do Estado, mas ainda por certificar, num processo que Miguel Fontoura reconhece ser moroso, e “outra área mais cinzenta”, a da dívida que não está assente em contratos, mas sim em promessas de contratos ou manifestações de interesse, cujo valor total não é possível contabilizar.
“Houve um risco”, por parte das empresas, admite o delegado da AICEP, considerando que deve ser visto à luz do contexto e da altura em que foram assumidos esses riscos.
“Era uma altura de crescimento económico de 15 e 20%, o Estado angolano tinha uma solidez financeira muito grande e havia uma grande necessidade de recuperar infraestruturas”, justificou.
O Estado angolano tinha pressa e as empresas portuguesas foram “neste caminho de confiança” que dificilmente voltarão a percorrer.
Miguel Fontoura sublinha que esta dívida, que não foi assente em contratos, “tem de ser objeto de análise muito cuidada”, mas acrescenta que se vivem “tempos novos” em que o próprio Estado angolano se mostra mais cauteloso e se apresenta como “bom pagador”.
“São tempos novos, de abertura, de clarificação e isso é bom para as empresas portuguesas que sabem com o que podem contar”, declarou à Lusa.
Por isso, acredita que não se vai voltar ao que acontecia no passado: “As orientações do executivo são muito claras” no sentido de que os contratos sejam visados pelo Tribunal de Contas e não dependam de “boa vontade” ou “caprichos”, o que é “um excelente sinal para as empresas”, concluiu.