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Eu não voto em João Lourenço

Post by: 18 Agosto, 2017

Acreditar na justiça social em Angola é o mesmo que acreditar no “conto de fadas” sobre a Isabelinha, que começou a vida a vender ovos e hoje é a mulher mais rica de África.

Por José Milhazes

Desde há uns tempos para cá que recebo com grande regularidade na minha caixa de correio electrónico propaganda do MPLA para votar no seu candidato a Presidente de Angola: João Lourenço.

Não sei qual será a razão destes esforços da propaganda do MPLA para conquistar o meu voto para o seu candidato no escrutínio de 23 de Agosto, pois não fui, nem sou cidadão angolano, nem conheço antepassados meus que por aí tenham passado. O que me liga a esse país lusófono são alguns amigos e os livros que escrevi sobre as relações entre a União Soviética/Rússia e sobre o “golpe de Nito Alves”.

Mas porque a máquina propagandística do MPLA tanto insiste, eu respondo que, mesmo que tivesse direito a voto em Angola, João Lourenço não seria de longe o meu favorito, não obstante as grandes promessas que faz.

O panfleto electrónico do MPLA apresenta dez razões para votar no seu candidato, mas todas elas são falsas e não lembrariam sequer ao diabo citá-las. A primeira reza que “O MPLA é o partido de todos os angolanos”, o que aconteceu durante muito tempo à custa de uma guerra civil cruel e do apoio externo. Hoje, se quisermos assistir a eleições livres, deverão haver angolanos que não se revejam nessa palavra de ordem, com “forte cheiro” a marxismo-leninismo.

Vamos aceitar como verdadeira a segunda razão: “O MPLA é o partido histórico e vitorioso”. Não se pode negar que essa força política combateu contra o colonialismo português, venceu na guerra civil contra a UNITA e irá vencer as eleições porque se trata de um escrutínio que ficará longe das razões prometidas a seguir.

No ponto 5 do dito panfleto, afirma-se que “O MPLA é o partido da governação moderna e transparente”, o que é desmentido por factos e números. De que transparência se pode falar num dos países mais corruptos do mundo, onde a “gasosa” é uma “instituição nacional”? De que transparência se pode falar num país onde se proíbe a transmissão de algumas televisões portuguesas só porque os dirigentes do MPLA não gostam das notícias?

Dizer que “O MPLA é o Partido do desenvolvimento económico e social” e “o Partido da cidadania e da justiça social” nem sequer é tentar “esconder o Sol com uma peneira”, mas recorrer à demagogia mais barata. De que desenvolvimento económico e social se pode falar quando apenas uma pequena elite vive “à grande e à francesa” e a maioria do povo vive na pior das misérias? Ou será que a maioria dos angolanos já têm meios para comprar propriedades e vistos gold em Portugal?

Acreditar na justiça social em Angola é o mesmo que acreditar no “conto de fadas” sobre a Isabelinha, que começou a vida a vender ovos e hoje é a mulher mais rica de África.

Quanto à cidadania, vejo-a entre aqueles angolanos que lutam contra o poder absoluto e a repressão do MPLA, por eleições verdadeiramente transparentes e democráticas: Luaty Beirão e outros companheiros seus, forças políticas da oposição que participam nas eleições para mudar o país mesmo em condições desiguais.

Por isso, também não acredito que “O MPLA é o partido do futuro previsível e seguro” e que é “O Partido do candidato certo, na hora certa, para o voto certo”.

A não ser que o general João Lourenço, que estudou na Academia Político-Militar Lenine de Moscovo, seja mais competente e dialogante do que aquele que o nomeou para seu sucessor, o Presidente José Eduardo dos Santos, que também estudou na União Soviética. Talvez a história da derrocada deste país, cuja subsistência se devia à exportação de gás e petróleo, tenha ensinado alguma coisa ao candidato do MPLA.

Dito isto, quero sublinhar que o destino está nas mãos dos angolanos e só a eles compete eleger os seus futuros dirigentes. Escrevi este texto apenas porque fui convidado a votar em João Lourenço e, não podendo fazê-lo pelas razões acima apresentadas, decidi manifestar a minha opinião.

P.S. Poderão acusar-me de eu estar a imiscuir-me nos assuntos internos de Angola e recomendar-me a olhar para o meu país. Esse argumento está gasto.

Observador

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