Apenas em ditaduras podemos ter certezas que em democracia não teríamos, e como o regime angolano claramente não é democrático e tem um sistema eleitoral que serve os seus interesses, então podemos afirmar que o resultado eleitoral que será anunciado virá apenas confirmar a continuidade da ditadura que brevemente vai completar 42 anos de vigência ininterrupta. Há essa certeza!
A simulação eleitoral culminará com a materialização do seu objecto principal: legalizar a ditadura por via eleitoral. Quanto aos partidos da oposição, que ao longo dos últimos meses ingloriamente têm denunciado as ilegalidades verificadas no processo, são os que têm a outra tarefa fundamental, que passa por legitimar a ditadura ao aceitarem participar dum pleito visível e descaradamente fraudulento.
Contudo, falemos do futuro de Angola. O país enfrenta uma crise financeira que tem provocado um aumento acelerado dos preços dos bens e serviços. A compra de 100 euros no mercado cambial paralelo – onde se pratica o câmbio real e não o estipulado administrativamente – ronda aproximadamente 40 mil kwanzas, a moeda nacional, quando em 2015 – pouco antes do governo ter admitido a existência da crise – comprava-se a nota por cerca de dez mil kwanzas.
Os mais de 20 milhões de angolanos pobres passaram a ser mais pobres ainda, e assim triplicaram os esforços de sobrevivência, quando os beneficiários do saque ao erário continuavam, e continuam, a usufruir das riquezas nacionais. Entretanto, a dificuldade de acesso às moedas estrangeiras – o euro e o dólar – atinge principalmente aqueles que fazem parte da classe média angolana.
O número de pessoas com acesso às moedas estrangeiras reduziu drasticamente, e quando aparece no mercado paralelo, vende-se a preços exorbitantes. Frisamos este aspecto porque é com moedas internacionais que os angolanos da referida classe pagam os tratamentos em hospitais no estrangeiro e a formação dos filhos, ou ainda compram os bens que revendem no país e as suas férias, ou seja, a classe média angolana está numa situação de aflição.
É nesse caos económico em que sempre viveu a esmagadora maioria dos angolanos onde a classe média começa agora a aproximar-se. E pelo que tudo indica, após a simulação eleitoral a situação estará pior. Estamos a ser fatalista, admitimos, mas não por mero desejo de fatalidade.
Ao longo do processo eleitoral, as habituais maratonas alcoólicas e entrega de bens como bicicletas, aparelhos de som e alimentares – actos definidos como corrupção eleitoral (art. 193.º da Lei N.º 36/11, de 21 de Dezembro - LOSEG) apenas foram realizadas na fase final, obviamente pelo sempre promotor MPLA, o que demonstra redução das receitas do Estado – pois é esta a fonte do dinheiro usado.
E como João Lourenço será mesmo o Presidente, falemos dele. Tal como em 1979 – data em que José Eduardo dos Santos chegou ao poder substituindo por mortis causa Agostinho Neto, primeiro Presidente de Angola –, certamente os membros mais influentes do MPLA esperam manieta-lo em proveito dos seus interesses. Mas, como fez o ainda Presidente, a situação pode alterar-se ao longo do tempo e termos um presidente materialmente "Chefe Disto Tudo". O certo é que João Lourenço é quem tratará de preservar os interesses do grupo de corruptos que representa, e esta é a principal razão da indicação procedida pelo Presidente José que, notemos, continuará a ser presidente do MPLA, logo, chefe do novo Presidente da República.
Porém, como dissemos no artigo A legitimidade conquistada pela morte, o sucessor poderá adoptar a repressão como forma de se afirmar entre os companheiros. O recurso à repressão poderá ser inevitável face ao nível de contestação que subirá doravante tendo como leitmotiv as dificuldades económicas que arrastam o país ao estado apocalíptico, onde tudo falta e todos sabemos quem são os culpados pela situação. Não é a baixa do preço do petróleo no mercado mundial, mas o desenfreado saque e má governança que tem à testa a família presidencial e generais actualmente sob investigação judicial em vários países, dos quais Portugal tem indiciado o vice-presidente Manuel Vicente por corrupção dum procurador luso.
Para travar essa veia repressiva, membros do MPLA que se posicionaram contra o actual Presidente, nomeadamente, Marcolino Moco, Irene Neto e Ambrósio Lukoki, deverão jogar um papel preponderante para que, a partir de dentro, não permitam que João Lourenço exerça o poder arrogantemente como fez o sucedido.
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