Não se vê acompanhado pelos seus ‘camaradas’ na defesa da sua governação que se resume numa das maiores tragédias do nosso tempo, num país coberto de recursos naturais, sem guerra, sem conflitos étnicos. Desgraça a todos os níveis. No social, no económico e no político. Como resposta a essa hipotética falta de solidariedade, João Lourenço quererá fazer uma limpeza do balneário na direcção do partido dentro de quatro meses.
A possível confirmação da dita limpeza em Dezembro não será nada de surpreendente. Até o mais desatento observador da política angolana sabe que não há um único dirigente do MPLA, com nome e história, que dê o ‘peito às balas’ em defesa de João Lourenço. Quase que não há uma única excepção à regra. Desde há alguns anos que esta tarefa ficou inteiramente relegada para ‘mercenários’ anódinos e para alguns militantes de quarta categoria que, muitas vezes, nem fazem a mínima ideia do que são orientados a defender publicamente.
Os que contam, os rostos importantes e ajuizados do MPLA sabem convictamente que não há ponta que se lhe pegue na governação de João Lourenço. Qualquer tentativa de defesa do que quer que seja de estrutural arrisca-se a confundir-se com um delírio de origem esquizofrénica.
Veja-se o caso do aumento das mais recentes três províncias. Des- provido de qualquer sentido de oportunidade, o projecto teve de ser apresentado com argumentos tão risíveis quanto o reforço da angolanidade, a defesa integridade territorial, o deslocamento de infra-estruturas e a promoção do desenvolvimento. Ninguém com sanidade plena e respeito próprio diria que, no contexto angolano, as autarquias fariam menos para o desenvolvimento sócio-económico do que a multiplicação de províncias.
As contradições e o descalabro estendem-se quase para tudo o resto. Com as conhecidas fortes restrições orçamentais no país, a ministra das Finanças conseguiu que fosse formalizada a orientação de cortes transversais na despesa. Ministérios, governos provinciais, empresas públicas e quejandos foram orientados desde o mês passado a limitarem os gastos ao estritamente necessário.
Servindo-se da alguma coragem que lhe é reconhecida, Vera Daves até fez questão revelar, na semana passada, o quão perto do fundo do poço se encontram as Finanças Públicas, ao avisar que até o pagamento oportuno dos salários já não é uma garantia. Ainda assim, como se João Lourenço integrasse um governo diferente deste em que Vera Daves é ministra, poucos dias depois, o país fica a saber que foi autorizada a compra de 30 veículos protocolares com preços que se fixam entre os 90 mil e os 290 mil dólares. Além de outras 35 viaturas que deverão servir o Secretariado do Conselho de Ministros. Definitivamente, o descaramento, a insensibilidade e a irresponsabilidade assumiram um rosto.
A resistência dos 'tubarões' do MPLA em defender o seu líder publicamente é, por isso, compreensível. Isto significa que os sinais persistentes de alguma coesão nas hostes dos 'camaradas não devem ser interpretados necessariamente como uma vénia à sua liderança. Será por outro motivo que vai além do valor de João Lourenço. O mais provável é que sejam os esforços derradeiros para a manutenção do próprio regime. Porque, verdade seja dita. Numa só frase, a governação de João Lourenço é uma soma de tragédias, logo indefensável em toda a sua extensão. Valor Económico