Mesmo depois de a Agência Britânica Anti-Fraude, envolvida na investigação do desvio de 500 milhões de dólares do Banco Nacional de Angola, que foram parar ao Banco Crédit Suisse em Londres, ter já garantido a devolução desse montante às autoridades de Luanda.
A Justiça angolana está perante um caso inédito ao constituir arguido pela primeira vez na sua história o filho de um antigo chefe de Estado.
Mas se ao abrigo da constituição de 2010 o antigo Presidente está imune a qualquer procedimento criminal contra ele durante os próximos cinco anos, o mesmo já não acontece com o filho.
O retorno do dinheiro às contas do BNA começa, por isso, a ser encarado como uma janela aberta para ser encontrada uma saída extrajudicial de um caso que agora não deixa dormir descansado José Eduardo dos Santos.
Apesar disso, o caso, segundo o subprocurador da República, Luís Benza Sanga, “vai ser levado até às ultimas consequências”.
Em causa estão crimes de burla e peculato e, nesta circunstância, o oficial da PGR afastou qualquer hipótese destes ilícitos poderem vir a ser contemplados pela última lei de amnistia por Eduardo dos Santos.
Por isso, ao enveredarem por uma solução negocial, as autoridades angolanas não irão abrir mão de um pedido de indemnização por parte dos autores desta fraude que terá sido caucionada por uma assinatura de Eduardo dos Santos.
Abandonado por todos quantos beneficiaram dos seus favores, o ex-governador do BNA, Valter Filipe, uma das peças-chave deste processo, é apontado agora como estando por trás da divulgação de um documento que implica diretamente o antigo Presidente.
Valter Filipe garante também estar na posse de documentos que, segundo apurou o Expresso, comprovam o alegado envolvimento tanto do filho de Eduardo dos Santos, como do sócio deste, Jorge Pontes, e demais implicados, entretanto constituídos igualmente arguidos.
No centro desta burla está a MFS — Mais Financial Services — uma firma-fantasma com pretensas ligações a José Filomeno dos Santos.
O depósito do dinheiro numa conta da Perfectbild Limited, um misterioso veículo sem qualquer ligação ao BNA, terá feito soar o alarme do sistema de compliance do banco londrino, que rapidamente informou Luanda sobre a descoberta de graves irregularidades na operação.
“O meu filho está a ser investigado também aqui e eu nem sei porquê...”. Este desabafo foi feito, há dias, pelo antigo Presidente num encontro privado na sede do MPLA quando aparentemente ainda não tinham conhecimento da dimensão do escândalo em que o filho estava envolvido.
A resposta não tardou e, nesta terça-feira, o subprocurador da PGR, Luís Zanga, confirmou a existência de fortes indícios de prática de crimes de “burla por defraudação, peculato, associação criminosa, tráfico de influência e branqueamento de capitais”.
As repercussões que a gravidade deste caso estão a ter na sociedade angolana, de acordo com uma fonte familiar, poderão estar na base do congelamento da deslocação que José Eduardo dos Santos deveria realizar no último fim de semana a Espanha.
Em Barcelona, o ex-Presidente angolano deveria dar sequência ao tratamento regular a que, nos últimos dois anos, se tem submetido mas esta situação, embaraçosa para a família tê-lo-á levado a mudar de planos para acompanhar pessoalmente em Luanda o seu desfecho.
“Ao recear o pior, desespera agora a todo o custo de proteger os filhos e por isso vai tentar prolongar a sua permanência na liderança do MPLA”, diz uma fonte da direção deste partido.
Mas depois de ter sido informado sobre as ligações internas e internacionais deste caso, José Eduardo dos Santos, segundo apurou o Expresso, temeroso sobre o que “poderá vir a acontecer” ao filho, acabou por dar luz verde ao prosseguimento das averiguações.
Aquele, por sua vez, terá interrompido de propósito a sua estada na Etiópia, onde reside a nova família, para proceder pessoalmente à entrega de uma carta à PGR e manifestar a sua disponibilidade em “colaborar” com as autoridades judiciais para a “resolução satisfatória deste processo”.
Depois de há uma semana ter assinado o termo de identidade e residência e de ter procedido à entrega do passaporte, nesta carta José Filomeno dos Santos mostra-se agora surpreendido com a divulgação, pela imprensa, de medidas de coação das quais alega não ter tido conhecimento prévio.
Uma fonte da PGR contactada pelo Expresso desmentiu esta versão e garante que o seu advogado foi na semana passada devidamente notificado da aplicação de medidas que, entre outras restrições, o impedem a partir de agora de sair de Angola e o obrigam a apresentar-se regularmente às autoridades. Expresso