Ouvido pela primeira vez em tribunal, Hilário Santos, de 45 anos, jornalista de profissão, é pronunciado nos autos como o assistente administrativo do GRECIMA que, pela sua fiel parceria e disponibilidade em angariar empresas e pessoas que quisessem “cambiar moeda” no referido gabinete, fazia o papel de “braço-direito” de Manuel Rabelais.
Esse papel conquistou com o tempo de convivência com Rabelais, uma vez que o considera, inclusive, como pai, por ser o indivíduo que o recebeu no mundo do jornalismo. Por ser uma pessoa de extrema confiança de Rabelais, Hilário era também chamado a cumprir missões para fora do país.
O réu mostrou que não está alheio ao que se estava a passar no tribunal e, embora seja a sua primeira vez a responder em juízo, confirmou que o GRECIMA solicitou divisas ao BNA para os encargos com a imprensa nacional e estrangeira, no intuito de não permitir que o nome de Angola e dos seus dirigentes, na altura, fossem manchados.
“Havia necessidade de mudar o paradigma, de mostrar uma Angola paalém das coisas más, principalmente na fase de campanha eleitoral”, declarou. É assim que, várias vezes, como acrescentou, o GRECIMA sofreu chantagens da imprensa estrangeira que tinham matérias que manchavam o nome do nosso país e dos seus dirigentes.
Para não permitir que estes artigos fossem publicados, Hilário Santos disse que se deslocou várias vezes a Portugal, com a missão específica de pagar estes órgãos. O juiz da causa, Daniel Modesto, perguntou ao réu de que órgãos se tratava e, ao meio a tantas explicações, Hilário acabou por citar os canais de televisão SIC e TVI.
Hilário não se lembra de quantas vezes teve de viajar, mas diz que foram muitas, pois, “muitas vezes, recebemos chamadas de vários órgãos que tinham matérias comprometedoras ou contra o bom-nome de Angola e dos dirigentes; muitas vezes fomos chantageados e os pagamentos iam entre os 40 e 50 mil euros. Eles alegavam que se não pagássemos, passariam a matéria”, reforçou.
Pagamento feito em mão e sem rastos
Todas as operações do GRECIMA eram de carácter sigiloso, como fez saber Manuel Rabelais, em declarações anteriores. Numa das audiências, ao ex-director do GRECIMA, o juiz presidente perguntou se participava mais alguém, nos despachos verbais do Presidente José Eduardo dos Santos, e Rabelais tinha respondido que além dele (o réu), o PR, algumas vezes participava Leopoldino Nascimento (tcp General Dino), o chefe da Casa de Segurança do PR, director do SINFO e de telecomunicações do PR.
Assim, as operações de Hilário Santos obedeciam ao mesmo critério (do sigilo máximo). Por isso, o dinheiro pago “para silenciar” quem queria falar mal de Angola e seus dirigentes, tal como respondeu na instância de Daniel Modesto, não tem qualquer rasto. Toda aquela quantia monetária era paga em dinheiro vivo e sem assinatura de qualquer documento.
Por estar a movimentar muito dinheiro, Hilário teve de recorrer ao apoio de várias pessoas de confiança para a sua transportação. São pessoas que não tinham qualquer vínculo laboral com o GRECIMA, que eram usadas apenas como “mula”, com o bilhete de passagem, hospedagem e alimentação grátis.
Com a excepção do bilhete – que eram custeados por empresas privadas com as quais o GRECIMA tinha parceria, cujo mote da negociação era o contra-valor junto dos bancos comerciais – outros gastos eram pagos pelo próprio GRECIMA. “Estas pessoas eram recrutadas por mim, em Luanda.
Elas tinham a missão única de transportar o dinheiro e não fazer a entrega – esta responsabilidade era minha – , da mesma forma que não sabiam a quem seria entregue o dinheiro. A operação era secreta, por isso, não tem nada documentado”, sublinhou Hilário.
Hilário não recebeu nenhuma recompensa e, inclusive, não ganhava como funcionário do GRECIMA, pois era quadro da RNA. Entretanto, quando tivesse viagens (para o interior e exterior do país) tinha direito às respectivas ajudas de custo, benefício este que as suas “mulas” também tinham.