"Tenho muita dificuldade em olhar para a repercussão que é dada aos alegados factos noticiados de outro modo que não seja como fazendo parte de perseguição pessoal, desde que fui investido nas funções de ministro das Finanças, em setembro de 2016", disse Archer Mangueira.
A declaração à Lusa surge no seguimento da notícia do jornal espanhol El Mundo, na segunda-feira, que dá conta de uma acusação das autoridades tributárias e judiciais espanholas sobre o alegado envolvimento de antigos governantes angolanos num esquema de corrupção para a construção de um mercado abastecedor em Luanda.
"Em primeiro lugar, declaro a minha total disponibilidade para cooperar com a Justiça em todas as instâncias a que possa, eventualmente, ser chamado a participar", escreveu Archer Mangueira na nota, na qual diz ter visto a notícia da Lusa, citando o jornal El Mundo e as investigações judiciais, com "estupefação".
Na nota, Archer Mangueira lembra que foi assessor económico do Presidente José Eduardo dos Santos entre dezembro de 2001 e janeiro de 2010 e garante que não teve "qualquer função executiva, nem qualquer envolvimento no projeto em causa".
De acordo com o jornal, que dedicou uma página da sua edição impressa de segunda-feira à notícia, com o título 'Uma folha encontrada em Lisboa em 2014 é prova-chave de subornos a Angola', a Justiça espanhola concluiu que o antigo vice-ministro do Comércio Manuel da Cruz Neto, o então diretor nacional do Comércio Gomes Cardoso e o antigo assessor económico de José Eduardo dos Santos e futuro ministro das Finanças Augusto Archer Mangueira, receberam subornos para permitir a construção de um mercado de abastecimento.
No total, estes três homens terão recebido 450 mil dólares, o equivalente a 381 mil euros, sendo 200 mil para o primeiro, 100 mil para o segundo e 150 mil para o terceiro, num processo que foi encontrado quase por acaso, já que resultou de buscas feitas pelas autoridades portuguesas e espanholas numa casa em Linda-a-Velha, nos arredores de Lisboa, há sete anos, numa outra investigação envolvendo o empresário luso-angolano Guilherme Taveira Pinto.
Em causa está o processo que as autoridades espanholas estão a preparar, e no âmbito do qual querem levar a julgamento 20 pessoas e oito empresas, entre elas a empresa pública Mercasa, por irregularidades detetadas entre 2006 e 2016 para a construção de um mercado de abastecimento na capital de Angola, Luanda, conforme a Lusa noticiou no final de 2019.
Segundo a Audiência Nacional, um tribunal especial que trata dos casos mais graves de corrupção, para obter o contrato foram pagas comissões às autoridades e funcionários angolanos, tendo os arguidos também ficado com uma parte dos fundos, que ascenderam a quase 20 milhões de euros.
Na nota enviada à Lusa, Archer Mangueira diz que "a quem esteja de boa fé, só pode causar estranheza o facto de eu ser associado como “ministro das Finanças” — funções em que fui investido há apenas cinco anos e que exerci até outubro de 2019 — aos alegados factos, que, a terem ocorrido, remontarão há cerca de 14 anos".
Para além disso, afirma "repudiar tão rebuscada orquestração" e critica a "forçada vinculação" do Governo angolano, que diz só poder servir para "obstruir o combate sem precedentes que está curso contra a corrupção.
No texto, o antigo ministro das Finanças e atual governador da província do Namibe diz ainda estar disponível "para colaborar em tudo o que a Justiça entenda ser necessário esclarecer neste caso".