O Parlamento definiu como prioridades para esta legislatura a aprovação do pacote legislativo sobre as autarquias locais, do Código Penal, Código de Família, e do Código de Processo Penal e a Lei Orgânica da Assembleia Nacional. Na sua opinião, que outros diplomas deviam ser priorizados?
Esses diplomas fazem parte das prioridades indicadas, na sessão oficial de início da actual legislatura, pelo Presidente da Assembleia Nacional. Nós acrescentamos outras, nomeadamente a revisão da actual Constituição da República de Angola, em especial no que respeita ao sistema de eleição do Presidente da República. Hoje, o Presidente é eleito à boleia das listas da Assembleia Nacional, e nós temos de retomar a condição de eleição directa do Presidente da República. Pretendemos também a revisão da Lei Eleitoral e da Lei da Comissão Nacional Eleitoral, de modo a democratizar os processos eleitorais em Angola. As eleições devem responder às normas internacionais e adoptadas pela SADC, comunidade de que somos parte integrante.
O que pretende ver mudado?
Urge acabar com os escândalos da manipulação dos processos eleitorais no nosso país e, com isso, proporcionar uma legitimidade reconhecida por todos aos governos daí resultantes. A Assembleia Nacional deveria ser capaz de criar um consenso interno e subscrevermos uma carta ao Tribunal Constitucional no sentido da revogação do acórdão que limita a fiscalização ao Executivo por parte
dos deputados e assegurar a transmissão dos principais debates da Assembleia Nacional na televisão pública.
Acha que entre os deputados, independentemente da sua formação política, existe um espírito de abertura para o diálogo e concertação para aprovação de diplomas?
Para servir o interesse nacional nunca teremos qualquer dificuldade em formatar consensos. Aliás, tem sido sob essa perspectiva que temos trabalhado com os outros partidos e coligação de partidos na oposição. Também convidamos o MPLA a juntar-se a nós na feitura de alguns diplomas no passado. Esse desiderato foi materializado aquando da aprovação da Lei Orgânica do Poder Local.
Estamos numa nova legislatura, na sua opinião como deve ser o relacionamento entre o poder Executivo e o Legislativo no que refere à fiscalização? Como acha que deve ser feita esta fiscalização?
A fiscalização dos deputados ao poder Executivo é condição essencial para que haja eficácia na governação. É uma questão universal. Um governo que não seja fiscalizado, governa mal. Fica desatento e não sente pressão para evitar vícios e falta de transparência. Portanto, é no interesse de todos que a fiscalização seja garantida e a mesma não deve afectar o bom relacionamento entre os poderes Legislativo e Executivo.
Nesta legislatura, temos um Parlamento marcado por um maior equilíbrio das forças políticas. Acha que essa composição vai proporcionar um maior equilíbrio nos debates dos temas mais candentes da vida do país?
Para mim, esta legislatura continua a manter um enorme desequilíbrio entre as forças políticas na Assembleia Nacional. O MPLA continua a dispor de uma maioria absoluta, o que a meu ver não favorece a busca de consensos. Vamos certamente continuar a assistir ao “rolo compressor”, ao “diálogo de surdos” e à “lógica da representação proporcional”, sempre que os interesses do regime estiverem em causa. Os desafios que o país tem pela frente não aconselham a radicalismos e ao orgulhosamente sós a que temos assistido até aqui. Duvido muito que haja grandes mudanças de atitude dessa maioria. Não se deve confundir democracia com a ditadura da maioria.
O que o seu partido vai fazer de diferente nesta legislatura?
Temos um aumento do número de mandatos, mas muito aquém daquele que poderia proporcionar equilíbrio nas votações. Vamos fazer tudo para estarmos ainda mais próximos do cidadão. Seremos uma oposição construtiva e certamente mais incisiva.
Desde a legislatura passada que os partidos políticos da oposiçãodefendem a transmissão dos debates em directo. Na sua opinião, o que falta para que este desafio se torne realidade?
Todos os partidos e coligação de partidos na oposição defendem as transmissões, portanto o travão está no MPLA e na sua direcção política, que têm tido medo de mostrar aos angolanos o que se passa de facto na Assembleia.
Na sua opinião, o Parlamento devia ter um canal aberto para a transmissão dos debates em directo ou devem ser transmitidos pela Televisão Pública de Angola?
O que lhe posso dizer é que a Assembleia Nacional tem todas as condições para efectuar os directos. Tem imensas câmaras, tem diferentes “regiões” e tem pessoal. Naturalmente que os meios de difusão nacional que servem a TPA 1 e 2, resultantes do investimento público, também podem servir para difundir um canal do parlamento, satisfazendo o interesse dos angolanos.
Acha que com a transmissão dos debates os cidadãos vão sentir de facto o vosso trabalho no Parlamento?
Sem dúvida que sim. Estarão melhor informados sobre o trabalho dos deputados e também entenderão melhor a importância deste trabalho, para o bom funcionamento das instituições em geral. A Assembleia Nacional desempenha um importantíssimo papel regulador em todas as democracias que funcionem.
Não há outras formas de os deputados mostrarem o seu trabalho?
Certamente que existem outras formas, mas o problema é sempre o mesmo: é importante que as missões e os trabalhos parlamentares sejam divulgados. A maioria das iniciativas do Grupo Parlamentar da UNITA não tem cobertura adequada nos órgãos de comunicação públicos.
Que alianças pensam fazer no Parlamento e fora dele para que o vosso trabalho tenha êxito?
As estratégias não devem ser excessivamente anunciadas para que tenham resultado.
A Assembleia Nacional define hoje a composição das comissões especializadas de trabalho. O que é que se lhe oferece dizer?
Essa questão da partilha das comissões é uma obediência rigorosíssima à representação percentual dos votos, mas a Assembleia não é isso. Democracia também não é isso. A ditadura da maioria e a democracia são coisas muito distintas. A Assembleia pratica a ditadura da maioria. A Assembleia Nacional significa partilha. A representatividade das maiorias é a voz daqueles que não votaram também.
Todos os membros da quinta comissão, até mesmo o segundo secretário, são do MPLA! Isso é vergonhoso! Eles agarram aquelas (comissões) que dizem que são delas e deixam aquelas que não querem. Isto não é Assembleia, é uma brincadeira!
A UNITA defende a revisão da actual Constituição. Com que fundamento?
É preciso mudar não só a Constituição, mas também revogar o acórdão que impede a fiscalização da Assembleia Nacional aos actos praticados pelo Executivo. Há deputados do MPLA a dizer que, de facto, temos que mudar isso tudo porque não está bem. Esta Constituição foi feita à medida do Presidente anterior. O Presidente da Assembleia Nacional admitiu que se for preciso vamos mudar a Constituição, vamos criar consensos. Seria bom que assim fosse porque as Constituições não são documentos definitivos, os países devem saber que as Constituições devem servir os interesses dos povos e os povos são dinâmicos. Aquilo que serviu no passado hoje não está mais adaptado ao presente. Acho que vamos ter, de longe, uma legislatura muito mais complicada que a anterior, por muitas razões: desde logo porque o país está pior. A Assembleia deve ter a capacidade de dizer que temos muitos problemas. Precisamos de um período de benesses e estamos todos maduros. Acredito que isso é possível. O MPLA deve dirigir-se à oposição e dizer ‘vamos abrir um período de tréguas’. É possível e vamos discutir aqui o programa nacional adoptado. Vamos buscar ideias dos outros e assumir o compromisso de levantar o problema económico do país por xis tempo. No mandato anterior houve três consensos que ficaram na história. Consegui fazer alguns acordos com o presidente do Grupo Parlamentar do MPLA que nunca aconteceram e foram feitos na lógica do interesse nacional. Não foram feitos noutra lógica, nem no interesse da UNITA, nem do MPLA. Nem o Gigi (Virgílio de Fontes Pereira, ex-presidente do Grupo Parlamentar do MPLA) pensou que o Adalberto era comprável. Nem pensei que ele era vendável também. Defendemos o interesse do país.
É possível fazer isso na actual legislatura?
Na minha leitura, isto hoje me parece mais difícil, pelos perfis das pessoas. A actual legislatura vai ser mais difícil porque as pessoas estão mais exigentes, estão com muitos mais problemas e estão mais intolerantes. A Assembleia está a brincar muito! Parece que não, mas está a brincar.
Programa de Governo da UNITA previa a reforma do Estado
Durante a campanha para as eleições gerais de Agosto último, a UNITA apresentou um programa de governo, denominado “Agenda 2030” que, caso fosse sufragado pelos eleitores, visava resolver os grandes problemas do país a curto e médio prazos, numa perspectiva daquilo que designou de Governo de Inclusão e Participativo (GIP).
O referido programa consubstanciava-se na “Agenda para a década”, centrada em políticas e programas estruturantes que visam o alcance de objectivos para a “construção da nação”.
Os objectivos passavam pelo resgate da cidadania, reforma profunda do Estado e a afirmação da “nova identidade de Angola”. Na perspectiva de curto prazo, o programa pretendia pôr em prática um plano de emergência nacional para garantir a estabilidade nacional e a recuperação económica. “A UNITA não propõe aos angolanos apenas um programa de governo no sentido clássico do termo. Propõe um programa para a construção da Nação e solicitamos um mandato claro para o povo receber de volta o seu país, aprovar uma nova Constituição, construir uma verdadeira democracia, refundar o Estado, edificar uma nova economia e construir fundamentos de um novo país”, sublinhou, na altura, o líder do partido e então candidato a Presidente da República.
O programa estaria aberto à participação de todos, sendo que na elaboração do Orçamento Geral do Estado, que a UNITA chamaria de “OGE da nova era” seriam incluídas iniciativas da sociedade para o bem comum. Além disso, o programa previa o reforço do saneamento básico e construção de novas redes de água, recuperação do atraso e liberalização do mercado energético, melhoria da capacidade de gestão da Sonangol e o agendamento das eleições autárquicas para 2018. O programa pretendia transformar Cabinda numa região autónoma.
Uma das políticas inseridas nas sete medidas de emergência nacional para a sua estabilidade económica e social seria a revisão do salário mínimo nacional que passaria a ser de 83 mil kwanzas, equivalente a 500 dólares.
A UNITA apontou os fundamentos para que tal fosse possível e lembrou que actualmente o país conta com 300 mil trabalhadores activos que ganham menos de 83 mil kwanzas por mês, sendo 43 por cento no sector público onde se paga o mínimo médio de 33 mil kwanzas e 73 por cento no sector privado, com os mínimos de 16 mil kwanzas para agricultura e 20 mil kwanzas para o sector dos transportes, indústria e serviços e 24 mil kwanzas para o comércio. A UNITA defende que “o país não se pode desenvolver com este nível de salários”.
Política de investimento
Sobre a política de investimento do Governo de Inclusão e Participativo, a UNITA disse que a mesma iria orientar-se num sentido “francamente positivo”, com o objectivo de atenuar o ritmo inflacionário. Quanto ao investimento privado nacional e externo, o maior partido na oposição propunha grandes alterações que permitissem a ampliação de condições para a restauração da confiança dos agentes económicos.
Caso a UNITA formasse governo, a redução da taxa de inflação e o aumento do poder de compra constituiriam motivos prioritários. Iria reforçar o mecanismo de controlo de preços e da fiscalização e defesa da concorrência.
Partido tem na actual legislatura a maior representatividade de sempre
Fundada a 13 de Março de 1966, a UNITA é um dos três então movimentos de libertação do país, a par do MPLA e da FNLA. Desde as primeiras eleições da história do país, em 1992, o partido sempre participou em eleições.
A UNITA foi sempre a segunda maior força política do país, atrás do MPLA. Nas eleições de 1992, a UNITA conseguiu eleger 50 deputados. Em 2008, seis anos depois do alcance da paz definitiva em Angola, o partido, já sob a liderança de Isaías Samakuva, viu reduzir a sua representatividade na Assembleia Nacional, ao conseguir eleger apenas 16 deputados, tendo perdido assim 34 assentos.
Nas eleições de 2012, o maior partido na oposição aumentou consideravelmente o seu grupo parlamentar, saindo dos 16 para 32 assentos. Entretanto, a maior representação de sempre da UNITA é alcançada na actual legislatura, já que o partido conseguiu eleger 51 deputados.
Além dos 51 parlamentares da UNITA, o actual Parlamento é composto por 150 deputados do MPLA, 16 da coligação CASA-CE, dois do PRS e um da FNLA.
O líder da UNITA, que pela segunda vez consecutiva viu gorada a sua pretensão de ser o Presidente da República, afirmou que, na actual legislatura, o seu partido vai adoptar uma postura de maior impacto para dignificar a Assembleia Nacional e trabalhar para uma verdadeira separação de poderes e despartidarização das instituições do Estado. Isaías Samakuva fez essa afirmação após a tomada de posse dos deputados à Assembleia Nacional.
“Temos toda a necessidade de enveredar por essa luta que consolide o Estado”, defendeu Isaías Samakuva.
A UNITA tem no seu grupo parlamentar o deputado mais novo da actual legislatura. Trata-se de Manuel da Costa Ekuikui, 28 anos, que promete servir os cidadãos e não ser servido.
“Queremos estar mais próximos do cidadão. Estamos aqui para inovar e tentar cumprir com as expectativas do eleitorado”, prometeu “Nelito” Ekuikui, eleito pelo círculo provincial de Luanda.
Perfil
Adalberto Costa Júnior
Naturalidade: Chinjenje (Huambo), 8 de Maio de 1962, casado e pai de três filhas
Habilitações Litérárias: Engenharia Electrotécnica no Instituto Superior de Engenharia do Porto; Curso de Ética Pública na Universidade de Roma.
Habilitações Profissionais: Cursos de Informática, Comunicação e Marketing Político, Jornalismo, Inglês no Instituto Americano de línguas e Italiano em Roma.
Línguas: Português, Inglês, Italiano e Francês (razoável)
Funções: Representante da UNITA em Portugal, em Itália e junto do Vaticano. Foi ainda Secretário Provincial da UNITA em Luanda em 2003, Secretário Nacional para a Comunicação e Marketing da UNITA 2003-2009, Secretário Nacional para os Assuntos Patrimoniais da
UNITA 2009-2011, Porta-voz oficial da UNITA 2003-2008, Presidente do Grupo Parlamentar desde Dezembro de 2015. (Jornal de Angola)