Paulo Blanco, que já foi advogado de Manuel Vicente e é arguido no julgamento da Operação Fizz, defende que a “decisão de arquivamento” de um processo em que o ex-vice-Presidente de Angola era investigado pela compra de casas no empreendimento Estoril Sol Residence “foi tomada pela diretora do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP)”. Na sessão de julgamento da Operação Fizz desta quinta-feira, Blanco revelou ainda que o ex-dirigente angolano vendeu os seus bens em Portugal porque estava “intranquilo” e queria evitar “chatices”.
Paulo Blanco continuou a desenvolver a sua defesa, tentando contestar, ponto por ponto, a acusação do Ministério Público num processo que fragilizou as relações diplomáticas entre Portugal e Angola. O advogado – que responde por um crime de corrupção ativa e de falsificação de documento e outro de violação do segredo de justiça – sublinhou a ideia de que, no processo em que Manuel Vicente era visado pela compra do apartamento (e que foi tornado independente por proposta do procurador Orlando Figueira), não encontrou “qualquer discordância da doutora Teresa Sanchez quanto à extração de certidão de processos”, ao contrário da tese da acusação.
Para o Ministério Público, Orlando Figueira teria sugerido a separação dos processos na parte que dizia respeito a Manuel Vicente por ter sido corrompido pelo antigo vice-Presidente angolano, com vista ao seu arquivamento. Para o Ministério Público, essa decisão, como outras que visaram Manuel Vicente, tiveram como contrapartida o pagamento de mais de 700 mil euros ao procurador Orlando Figueira.
Blanco tentou desmontar alguns dos argumentos da acusação. Por um lado, recusou que haja no processo contra Manuel Vicente “qualquer discordância” de Teresa Sanchez quanto à decisão de extrair certidões do inquérito principal. Por outro lado, aponta responsabilidades diretas a Cândida Almeida, então diretora do DCIAP, pelo rápido arquivamento desse novo processo.
“Esta decisão de arquivamento foi tomada pela diretora do DCIAP”, disse Paulo Blanco, notando que é “a própria acusação que diz que quem decidia era a diretora do DCIAP”, acrescentou o advogado, para assinalar a “contradição” do Ministério Público, que também imputa a Orlando Figueira essa decisão. “Não existe nos autos nenhuma evidência dessa discordância, mas, ao contrário, existe concordância prévia e posterior da doutora Cândida Almeida” com o arquivamento. A versão de Paulo Blanco surge, assim, alinhada com a posição já assumida por Orlando Figueira na contestação que fez à acusação.
O procurador é acusado de um crime de corrupção passiva e de um crime de branqueamento de capitais, neste caso em co-autoria com Manuel Vicente, Paulo Blanco e Armindo Pires. Também responde pelos crimes de violação de segredo de justiça e de falsificação de documento. O MP acredita que recebeu um total de 763.429,88 euros para arquivar os processos-crime que tinha em mãos e que envolviam Manuel Vicente.
Manuel Vicente vendeu bens para evitar “chatices”
Na sua longa exposição – foi o único arguido a intervir durante a manhã e ainda não respondeu às questões do Ministério Público ou da sua defesa –, Paulo Blanco explicou por que razão Manuel Vicente decidiu vender os bens que tinha em Portugal. O ex-vice-Presidente angolano quis evitar mais “chatices”, num momento em que o seu nome já estava nos jornais associado à Portmill (empresa por onde passou o pagamento de vários apartamentos naquele empreendimento do Estoril).
Quando vendeu o apartamento, Manuel Vicente também passou a participação que detinha no Banco BIC. Seguiu os “conselhos” que “algumas almas” lhe deram de que era incompatível estar ligado ao banco angolano quando era membro do conselho de supervisão do BCP, diz Paulo Blanco. Vendeu, mas manteve essas ligações na sua “órbita familiar”, ao constituir a Edimo.
Já em relação aos apartamentos, o destinatário escolhido foi Armindo Pires. “Dada a relação de amizade [entre Manuel Vicente e Armindo Pires], é natural que tenha preferido vender a uma pessoa amiga e que tenha permitido o pagamento a prestações, que não permitiria a outra pessoa”, disse Paulo Blanco ao tribunal.
Arquivamento relâmpago “não foi tratamento de privilégio” a Manuel Vicente
Dias depois de ter sido extraído do processo principal, o inquérito em que era investigado o ex-dirigente angolano foi arquivado. O tribunal quis saber porque teve esse processo uma “tramitação tão rápida” comparativamente com o original. Paulo Blanco garante que não foi um “privilégio” concedido a Manuel Vicente.
O presidente do coletivo, Alfredo Costa, questionou diretamente Paulo Blanco. O tribunal queria perceber “porque é que o processo que dá origem ao 5/12 teve esta tramitação tão rápida relativamente ao originário”, uma vez que a investigação era nos mesmos moldes” da original.
Na resposta, o advogado explicou que Manuel Vicente – que Paulo Blanco representava em Portugal, através de Armindo Pires – “veio voluntariamente” ao processo esclarecer as dúvidas que o procurador Orlando Figueira teria. “Não houve aqui nenhum tratamento de privilégio que não fosse o facto de o engenheiro Manuel Vicente ter vindo voluntariamente ao processo”, justificou o advogado. Obsevador