A sentença do Tribunal de Recurso de Paris, que obriga ao pagamento de uma indemnização à PT Ventures, não visa apenas a Vidatel, empresa da empresária angolana Isabel dos Santos, mas também a Mercury, empresa controlada pela Sonangol, e a Geni, empresa de Leopoldino Fragoso do Nascimento (Dino). Um comunicado enviado às redações a 26 de janeiro, há uma semana, pela petrolífera Sonangol tinha dado a entender que apenas Isabel dos Santos seria obrigada a pagar essa indemnização. Trata-se de um processo judicial em torno da operadora móvel angola Unitel.
O Expresso teve acesso à sentença daquele tribunal e nela pode ler-se que foi dado provimento aos argumentos da PT Ventures, tendo sido considerado que os réus (Vidatel, Mercury e Geni) violaram o acordo parassocial de acionistas, e além disso não cumpriram deveres relativamente ao pagamento de dividendos a partir de 2013.
"Os réus são solidariamente responsáveis pelo pagamento de uma indemnização à queixosa (a PT Ventures) no montante de 339,4 milhões de dólares, decorrentes da perda de valor das ações desta na Unitel por causa da quebra do acordo parassocial", lê-se na sentença. Fica assim claro que os três referidos acionistas são visados pelo Tribunal de Paris.
Segundo a sentença, não está apenas em causa a referida indemnização de 339,4 milhões de dólares. Os réus, Vidatel, Mercury e Geni, terão de pagar ainda dividendos da Unitel. "Têm ainda de pagar mais 314,8 milhões de dólares de compensação por danos causados à queixosa em resultado de dividendos não pagos desde 2013. Dividendos que os réus não podem reclamar junto da Unitel". Ao todo em divida à Unitel estão 653,4 milhões de dólares.
Mas no comunicado da Sonangol lia-se apenas que a Vidatel de Isabel dos Santos iria ter de pagar 339,4 milhões de dólares de indemnização à PT Ventures, na sequência de um contencioso em torno da operadora Unitel, que a antiga empresa do grupo Portugal Telecom controlava, sendo isso o que tinha decidido o Tribunal de Recurso de Paris. Porém, a Vidatel não foi a única empresa visada pela decisão do tribunal parisiense, foram também a Mercury e a Geni.
E se é certo que a PT Ventures pode decidir contra qual dos réus executa a sentença, já que eles são solidários entre si, também é verdade que mais tarde os réus terão de se entender face à forma como farão os acertos de contas entre si. Ao que se pode ler no comunicado, aparentemente a Sonangol decidiu que seria a Vidatel a pagar.
O comunicado que a Sonangol enviou às redações na passada terça-feira foi omisso, só revelando parte da informação. "O pedido de anulação da referida decisão interposta pela Vidatel foi indeferido por sentença judicial do Tribunal de Paris e foi reiterada a decisão do Tribunal arbitral, tendo ainda condenado a Vidatel ao pagamento de 339,4 milhões dólares a título de compensação à PTV e as respetivas despesas legais do processo", lia-se então no referido comunicado.
A Sonangol deixava ainda claro na informação enviada às redações que iria exercer os seus direitos. "Confirma-se a legitimidade da PT Ventures para a execução da sentença arbitral no valor de 339,4 milhões de dólares contra a Vidatel", avisava.
O Expresso pediu esclarecimentos à Sonangol, nomeadamente sobre se pediu apenas à Vidatel o pagamento da indemnização e porquê, mas até ao momento ainda não obteve qualquer resposta.
O processo em torno da operadora de telecomunicações móveis angolana Unitel arrasta-se há anos. E entronca na falhada fusão da PT com a brasileira Oi, em 2014. A PT, fundadora da Unitel, controlava 25% do capital da operadora, que ficaram nas mãos da Oi, na sequência de uma fusão que acabou na realidade, por nunca acontecer. Em 2019, a Oi vendeu a participação de 25% da Unitel à Sonangol.
A Vidatel, a Mercury e a Geni decidiram avançar com um processo no Tribunal de Recurso de Paris considerando que no âmbito dessa venda tinha sido violado o acordo parassocial de acionistas, mas o tribunal deu razão à PT Ventures, hoje controlada pela petrolífera Sonangol. E decidiu anular uma ação interposta pelos três acionistas.
A Unitel era, até janeiro de 2019, controlada por quatro acionistas, cada um dos quais com 25%: a brasileira Oi, a Sonangol, a Vidatel e a Geni.
Em dezembro desse ano, recorde-se, o Tribunal Provincial de Luanda decretou o arresto preventivo dos bens de Isabel dos Santos, entre eles a participação na Unitel. E no ano seguinte, a 26 de janeiro, a Sonangol comprou a posição da Oi na PT Ventures por mil milhões de dólares (900 milhões de euros), tornando-se a maior acionista da operadora angolana, com 50% do capital.